Folha de S. Paulo


Helena Ranaldi contracena com anões em clássico de Ibsen; veja vídeo

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O cenário é montado com móveis em miniatura, como os feitos para as crianças brincarem de casinha. Os personagens masculinos são pequenos, fisicamente. As mulheres têm que se abaixar para interagir com eles.

Em "A Fantástica Casa de Bonecas", que estreia no próximo dia 21, em São Paulo, a atriz Helena Ranaldi contracena com três atores anões. Ela faz o papel de Nora, a mulher submissa da peça "A Casa de Bonecas", do norueguês Henrik Ibsen (1828-1906), um clássico do teatro —e do feminismo.

"A opção por atores anões é muito interessante: obriga as personagens mulheres a se abaixarem e a rastejarem para falar com os homens. É um retrato físico da submissão", observa Ranaldi.

Para a diretora Clarice Abujamra, a escolha desses atores é um comentário implícito, que dá o tom a toda montagem. Não só o viés crítico, mas o de um certo delírio cênico.

"É a loucura da situação da personagem levada ao extremo. E todos nós, elenco e produção, entramos nesse delírio", diz a diretora.

A opção, claro, carrega seus riscos. O principal é "errar a mão", segundo Clarice. Por isso, no primeiro encontro com a equipe, pediu: "Quero que seja [uma montagem] bela, um conto de fadas da melhor qualidade".

Famosa por seu trabalho em dança, a diretora coreografou todos os movimentos cênicos, para fugir da caricatura e criar uma espécie de leveza visual para o drama.

"Usamos os limites dos corpos dos atores buscando a beleza cênica, sem ridicularizar, sem ferir. Não temos margem para escorregar: ou dá certo ou vamos todos para o buraco", diz.

Uma semana antes da estreia, em um ensaio acompanhado pela Folha, atores e direção pareciam seguros de terem superado o risco.

"A peça foi a oportunidade que esperei por todos esses anos de carreira. Normalmente somos chamados só por causa de nossa condição física, não por nosso talento", diz Fernando Vigui, que faz o papel de Torvald Helmer, marido de Nora.

A protagonista que se diminui e se anula diante do marido vai se transformando durante a peça. "E ela transforma o marido nesse processo. Ele percebe o quanto era... desculpe, Fernando... pequeno", diz Ranaldi, ao lado do colega ator.

Vigui afirma que não tem o menor problema de ser chamado de anão ("Não preciso ser politicamente correto"), mas sim de não ser visto como o ator de verdade que é.

A procura desses atores quase que exclusivamente para papéis estereotipados é motivo de piada para a atriz Veronica Ned, filha do cantor Nelson Ned (1947-2014).

"Quando uma amiga me avisou que estavam procurando atores anões para essa peça, ela me disse que era um infantil. 'Que preguiça!', pensei, só aparecem papéis assim", diz Veronica.

Ao perceber que não era nada do que a amiga pensara, ela se jogou de cabeça na peça, onde faz o papel de homem (Doutor Rank).

Giovanni Venturini, que faz o antagonista Nils Krogstad, conta que nem titubeou ao receber o convite. "Fiquei enlouquecido. É um personagem complexo, é um vilão, que me dá a oportunidade de explorar e aprender muitas coisas como ator. A condição física entra no jogo, mas com um sentido muito claro e interessante."

Fotografia: ISADORA BRANT | Edição: DIEGO ARVATE

A FANTÁSTICA CASA DE BONECAS

QUANDO estreia dia 21/3. Sex., às 21h30, sáb., às 21h e dom., às 19h. Até 31/5

ONDE Teatro das Artes, av. Rebouças, 3.970, 3º piso, tel. (11) 3034-0075

QUANTO R$ 80

CLASSIFICAÇÃO 16 anos


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