Folha de S. Paulo


Com status de cult, Odair José lança disco de rock com show em São Paulo

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Odair José está em forma. Para a sessão de fotos que ilustra esta página, o cantor se equilibra no sofá de um restaurante no centro de São Paulo. A posição –os pés apoiados no encosto e a cabeça pendendo contra a gravidade– exige que ele force o abdome para não cair. Ele aguenta o tranco?

"Tá achando o quê? Eu corro 1.200 km por ano, rapaz", afirma o cantor goiano sobre seu condicionamento físico, apontando os dois indicadores para a lente do fotógrafo.

Aos 66 anos, Odair José diz que se exercita religiosamente todas as manhãs, jura que não se cansa nunca e que tem gás para tocar ao vivo "durante duas horas, sem parar".

Eduardo Knapp/Folhapress
O cantor Odair José posa para em restaurante no centro de São Paulo
O cantor Odair José posa em restaurante no centro de São Paulo

A prova dos nove acontece nesta quinta (12) e sexta (13), quando ele apresenta o show de lançamento do seu novo álbum, "Dia 16" na choperia do Sesc Pompeia.

O nome do 35º álbum de inéditas de Odair é uma alusão a seu aniversário, em 16 de agosto. "É tempo de comemorar", dizem os versos de "Dia 16", a primeira do disco.

E é mesmo, ao menos para Odair José, que inclui a música entre os cinco melhores de sua discografia.

"Passei um período achando que eu era um merda", diz ele. "Dos anos 80 aos 2000 tenho um trabalho desnecessário. Eu fazia disco por fazer."

Parte da virada veio com o tributo "Vou Tirar Você Desse Lugar" (Tratore), lançado em 2006. O disco reúne releituras de sucessos de Odair José gravadas por músicos pop, como Mombojó, Zeca Baleiro, Pato Fu e Mundo Livre S/A.

Em 2013, a Universal relançou uma caixa com os quatro primeiros álbuns do cantor: "Assim Sou Eu..." (1972), "Odair José" (1973), "Lembranças" (1974) e "Odair" (1975).

JUÍZO DO TEMPO

"Ele sempre foi um artista influente, mas agora, com o juízo generoso do tempo e da história, tem sido devidamente reconhecido e será cada vez mais", diz Zeca Baleiro, que produziu "Praça Tiradentes", penúltimo álbum de Odair, lançado em 2012.

No fim, o reconhecimento de artistas mais jovens acabou fazendo com Odair o que o título do álbum-tributo anunciava.

"Quando cruzava com esse pessoal mais jovem, ouvia [eles dizerem]: 'Você é muito bom'. Comecei a analisar aquilo", conta ele. "Isso me fez olhar de novo para o meu trabalho como olhava nos anos 1970."

Com levada rock e pop, "Dia 16" foi gravado no mesmo espírito de "O Filho de José e Maria" (1977).

Considerado o trabalho mais experimental de sua carreira, a ópera-rock adaptava a trajetória bíblica de Jesus Cristo com episódios de descoberta sexual. Acabou censurada pela ditadura, por pressão da Igreja Católica.

A ideia do novo álbum, assim como em "O Filho...", era entrar no estúdio com todos os músicos ensaiados, como uma banda de garagem, e "fazer um disco que a gente pudesse repetir no palco".

"O que esse disco tem de novo é a simplicidade e a liberdade do alternativo, de fazer a coisa como quis fazer. Ele é disciplinado, radiofônico", comenta o cantor. "Espero que as pessoas concordem."

Da ópera-rock, "Dia 16" herda a música "Fera", deixada de fora de "O Filho de José e Maria" pela gravadora e inédita desde então.

De sua trajetória, o cantor preserva o estilo de compor, que define como "repórter musical". Brega, jamais.

"Desde 1970, o Roberto Carlos canta bolero. Então ele é um cantor de bolero? Não, ele é o Rei. Agora, se você faz um bolero, uma balada, é brega", defende Odair, para quem não há "nada mais pop, mais rock 'n' roll" do que o que faz desde o primeiro disco: compor sobre o cotidiano e os tabus da sociedade brasileira.

"Em vez de falar 'eu te darei o céu', as pessoas estavam indo para a cama, estavam fazendo sexo na beira do muro. Eu fui relatar isso nas minhas músicas."

Tocando em boates no Rio de Janeiro, conheceu um homem que se apaixonou por uma prostituta e acabou se casando com ela. O resultado foi a canção "Vou Tirar Você Desse Lugar", de 1972.

Prostituição, pílula anticoncepcional ("Uma Vida Só - Pare de Tomar a Pílula"), maconha ("A Viagem"), as humilhações vividas por uma empregada doméstica ("Deixa Essa Vergonha de Lado") –muitas foram as questões morais que entraram no radar de Odair José desde os anos 1970.

Desta vez, dois tabus se destacam em "Dia 16". Da pílula, Odair José passou para os "vaso-dilatadores", eufemismo para os remédios da família Viagra. Em "A Moça e O Velho", ele discute o preconceito que costuma acompanhar os comentários sobre casais com diferença de idade.

"Pode até ser que a moça esteja com o velho por algum interesse", explica."Mas hoje em dia os velhos ainda dão no couro. Eu sou um velho, e acho que ainda dou no couro."

Sobre "Sem Compromisso", ele diz que defende o sexo fora do casamento: "O cara tem amante e não concorda que a mulher dele faça o mesmo, isso é o quê? Hipocrisia. Ô, bicho, tem tesão no cara? Vai dar para ele. As pessoas serão mais felizes".

"O brasileiro é moralista. Acho bom liberar o olhar, parar com essa coisa de 'não pode'", diz o cantor.

SHOW DE LANÇAMENTO
QUANDO nesta quinta (12) e nesta sexta (13), às 21h30
ONDE Sesc Pompeia, r. Clélia, 93, (11) 3871-7700
QUANTO de R$ 9 e R$ 30
CLASSIFICAÇÃO 18 anos

Fotografia ANDRÉ FELIPE e CARLOS CECCONELLO | Edição ANDRÉ FELIPE


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