Folha de S. Paulo


Estudo desbanca tese de que pintura de Pollock era aleatória

Um novo estudo de uma pintura de Jackson Pollock desbanca a tese de que o expressionista abstrato norte-americano criava suas composições arremessando tinta e outros elementos de forma aleatória sobre a tela.

Em exibição agora na sede da coleção Peggy Guggenheim, em Veneza, "Alchemy", uma obra de 1947 do artista, tem por trás de suas camadas superficiais de tinta uma estrutura quadriculada desenhada em branco que serviu de guia para Pollock na construção desse trabalho.

Morto aos 44, em 1956, Pollock foi um dos maiores nomes do expressionismo abstrato nos Estados Unidos e figura central do deslocamento das vanguardas para Nova York, substituindo Paris, arrasada pela Segunda Guerra.

Sua técnica conhecida como "drip painting", ou pintura com respingos, em que o artista deitava a tela no chão e arremessava os pigmentos contra sua superfície, dando o efeito de uma tempestade de cor, entrou para a história associada à liberdade de expressão e renovação estética pregada pelos Estados Unidos.

Mas a descoberta recente, constatada depois de mais de um ano de restauro e limpeza de "Alchemy" em Florença, prova que Pollock tinha um plano definitivo para estruturar a composição. Sendo essa sua primeira tela pintada com respingos de cor, especialistas acreditam que o artista possa ter tido planos mais precisos para o resto de sua obra.

"Isso nos surpreendeu", diz Roberto Bellucci, um dos curadores da coleção Peggy Guggenheim, em entrevista à Folha. "O quadro foi planejado nos menores detalhes, projetado para ter esses efeitos de luz e relevo. Ele tinha uma técnica de extrema precisão para conduzir sua pintura."

Bellucci acrescenta que Pollock não só planejou a posição de cada traço e elemento de cor, como também alterou a densidade dos pigmentos –ele usava tintas comerciais, de parede e automotiva– para criar efeitos cromáticos e de textura, como os dois tipos de preto e os vários tons de amarelo e azul agora visíveis na tela, que antes estava esmaecida por camadas de sujeira.

Esse dado muda a interpretação de "Alchemy", uma das telas com a maior quantidade de matéria aplicada pelo artista, desde tinta a areia e pequenos pedregulhos.

vaso de flores

Radiografias do quadro também revelaram que Pollock não começou pintando sobre uma tela em branco. Por trás da composição, havia desenhos figurativos que especialistas acreditam ser de autoria da mãe do artista, que pintava quadros decorativos.

"É possível reconhecer nas imagens de raios X o desenho de um vaso de flores", diz Bellucci. "Tudo indica que essa tela já estava sendo usada por sua mãe e que ele começou a pintar seu quadro por cima. Existe até uma carta dela para o filho pedindo de volta algumas de suas telas."

Depois de "Alchemy", que está exposta junto de um vídeo e imagens que documentam seu processo de restauro, a coleção Peggy Guggenheim vai começar, em março, a restaurar as outras dez pinturas de Pollock em sua coleção, num processo que deve ser aberto ao público em Veneza.


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