Folha de S. Paulo


Crítica: 'Sniper Americano' coloca espectadores em formidável ambiguidade

Se "Sniper Americano" ganhar o Oscar de melhor filme neste ano, será essencialmente por duas razões: a) ser um filme a favor da guerra; b) ser um filme contra a guerra.

Pois é nessa formidável ambiguidade que o filme de Clint Eastwood joga os eleitores do Oscar e os espectadores em geral ao descrever a trajetória de Chris Kyle, herói americano tão heroico que tem direito até a um dia memorial dedicado apenas a ele.

Mas quem é esse herói? Sucintamente: um atirador de elite cuja função é proteger o avanço das tropas em suas incursões urbanas no Iraque.

O responsável por matar pouco menos de 200 pessoas na guerra de que participa se sentindo sempre na obrigação de usar seu dom de grande atirador para a proteção dos colegas.

HEROÍSMO?

Mais ainda: que herói é esse? A dúvida o assola por todos os lados. Por acaso existe heroísmo em matar uma mulher e uma criança (seus primeiros feitos)? Seus colegas dizem que sim. Ele não tem o mesmo entusiasmo. Sua função é defendê-los. Ele a executa, ponto.

Com a trajetória do persistente Kyle, Eastwood nos projeta no terrível pantanal em que os norte-americanos se afundam no Oriente Médio, um Vietnã urbano, onde nem ao menos se distingue o amigo do inimigo.

Na terrível aridez de "Sniper Americano", aos gritos de "herói, herói" responde a frase do cineasta Samuel Fuller: na guerra, o único heroísmo é sobreviver.

No caso, uma guerra tão perturbadora que nem no front interno terminará para Kyle.

SNIPER AMERICANO
(AMERICAN SNIPER)
DIREÇÃO Clint Eastwood
ELENCO Bradley Cooper, Sienna Miller, Kyle Gallner
PRODUÇÃO EUA, 2014
AVALIAÇÃO ótimo


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