Folha de S. Paulo


Descendentes de Bernanos estão espalhados pelo Brasil

Poucos antes de morrer de câncer, em 1948, o escritor francês Georges Bernanos manifestou a vontade de voltar ao Brasil, de onde partira três anos antes.

Bernanos desejou fundar uma colônia francesa no período em que viveu por aqui (1938-1945). O projetou não se concretizou, mas o autor francês deixou raízes profundas no Brasil. Há descendentes de Bernanos espalhados por Mato Grosso do Sul, Minas, Santa Catarina e São Paulo.

Quando Bernanos voltou para a França, em 1945, uma de suas filhas, Chantal, decidiu permanecer no Brasil. Ela já era casada com o aviador Watson Mesquita, que conhecera em Barbacena.

Chantal e o marido viveram em Belo Horizonte. Tiveram seis filhos. Chantal morreu em 1980, aos 62 anos.

"Minha mãe se encantou pelo Brasil, não quis mais voltar para a França. Era cruzeirense doente e amava o Carnaval", conta a filha Nádia Cíntia Mesquita Guimarães, 57, neta de Bernanos.

Nádia, que mora em Formiga (MG), passou a infância ouvindo histórias do avô. "Ele tinha um gênio forte, não era tranquilo. Era muito rigoroso com os filhos. E tinha a cabeça um pouco estreita também, não comungava com os avanços do mundo moderno."

Além de Chantal, outra filha de Bernanos escolheu o Brasil para viver. Claude chegou a voltar para Paris com o pai, em 1945, mas quatro anos depois retornou, casada com o engenheiro agrônomo espanhol José Eugênio de Zayas D´Harcourt.

Claude herdou do avô o espírito aventureiro e o gosto pela vida no campo. Em 1955, ela e o marido instalaram-se na fazenda Serradinho, em Bonito, no Mato Grosso do Sul. Claude criou duas escolas e orientava as famílias do local, na época com pouquíssima infraestrutura.

Teve quatro filhos, seis netos e nove bisnetos. Morreu em 2009, em Bonito, aos 78 anos.

"Pelo que minha mãe contava, Bernanos era explosivo, muito angustiado, mas também muito dócil", conta Pilar De Zayas Bernanos, 64, filha de Claude, moradora de Florianópolis. "Ele gostava muito de criança, mas em geral ficava irado quando o assunto era política."

"Já minha avó, Jehanne, teve uma educação muito rígida e religiosa, nunca expressava opinião. Apenas cumpria com suas obrigações. Acho que ela sofria um pouco com as viagens e mudanças constantes, mas não dizia nada, sempre seguiu meu avô."

Há vários relatos sobre a beleza das filhas de Bernanos durante o período de Barbacena, de 1940 a 1945.

"Claude Bernanos é uma criatura de fogo. Herdou o perfil aquilino da mãe, uns toques de sublime do pai; os olhos rasgados, fuzilantes; o cabelo comprido, quase liso; os seios empinados, uma beleza selvagem", descreveu o historiador Pedro Octavio Carneiro da Cunha.

Em São Paulo também há parentes do escritor. Atualmente moram na cidade a nora de Bernanos, Elza Rodrigues, 86, viúva de Yves, sua filha Marie-Madeleine, 70, e dois bisnetos.

Dos seis filhos do escritor, apenas Dominique ainda é viva. Tem 86 anos e mora na França. Ficou no Brasil dos 10 aos 16 anos.

"Eu adorava viver em Barbacena. Era uma época muito alegre. Fiz muitas amizades, andei muito a cavalo. Eu amava a fazenda. Papai não era um bom fazendeiro, a vocação dele era escrever. Nós é que cuidávamos dos animais", conta Dominique num português com leve sotaque mineiro.


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