Folha de S. Paulo


Crítica: Naomi Kawase une cinema e poesia em busca do absoluto

A natureza, a morte, o sagrado, o amor. Nas quatro breves cenas que se sucedem e se confundem na abertura de "O Segredo das Águas", a diretora japonesa Naomi Kawase reafirma seu projeto de compor um cinema que se mescla à poesia e à filosofia na busca do absoluto.

Um cadáver encontrado à beira-mar funciona como fio condutor para o público que só se interessa pela trama. A maneira aleatória como a narrativa do filme se organiza, no entanto, convida a outro tipo de atenção.

Logo esquecemos dessa evidência banal de um mistério a ser resolvido para sofrermos o impacto das manifestações cotidianas da vida, presentes no sexo, na doença, na preparação dos alimentos, numa canção de amor e perda ou num simples banho.

Divulgação
Cena do filme 'O Segredo das Águas', da diretora Naomi Kawase
Cena do filme 'O Segredo das Águas', da diretora Naomi Kawase

Em torno do morto anônimo, "O Segredo das Águas" tece outros fios. Numa ponta está a jovem Kyôko, garota que sofre com o mal que consome o corpo de sua mãe jovem. Na outra ponta está Kaito, um rapaz desorientado pela separação dos pais.

Enquanto sofrem as dores das perdas, ambos se envolvem num namoro que dá seus primeiros passos e que os reúne na torrente da sexualidade. Suas experiências individuais se confundem com os sofrimentos e ressentimentos.

MINERAL

Nas histórias de cada um deles juntos é a ideia de ciclo que Kawase encena, inserindo os momentos individuais numa temporalidade cósmica que os atravessa e os ultrapassa.

A aparência simples com a qual a diretora filma os lugares e os corpos vem de seu extraordinário trabalho como documentarista antes de se tornar celebrada como um dos grandes nomes do cinema contemporâneo de ficção.

Não se trata de recurso para intensificar a veracidade, como no realismo tradicional. Quando Kawase o usa em "Segredo das Águas", ganhamos mais que lucidez, contemplamos um cinema animal, vegetal, mineral, vital.

O SEGREDO DAS ÁGUAS
(Still the Water)
DIREÇÃO Naomi Kawase
ELENCO Nijirô Murakami, Jun Yoshinaga, Miyuki Matsuda, Makiko Watanabe
PRODUÇÃO Japão, 2014, 16 anos
QUANDO estreia nesta quinta (15)
AVALIAÇÃO ótimo


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