Folha de S. Paulo


HQ 'Do Inferno' ganha edição de luxo e versão para a TV

Na madrugada de 31 de agosto de 1888, apenas um candeeiro iluminava a viela de Buck's Row, em Londres. Um comerciante se surpreende ao encontrar o que parece ser um grande fardo na calçada. Era o corpo de uma mulher, que teve a garganta cortada de uma orelha à outra.

O cenário lúgubre descreve o primeiro de cinco crimes bárbaros que aterrorizaram o bairro de Whitechapel e a Inglaterra do século 19. As mortes dariam origem ao mais famoso dos assassinos em série, que ficaria conhecido como Jack, o Estripador.

Obsessão da polícia da época, o criminoso nunca foi pego e parecia se divertir com o jogo de gato e rato. Algumas cartas provocativas às autoridades publicadas pelos jornais foram atribuídas a ele. Em uma delas, o endereço do remetente era: "Do Inferno".

CAPA DURA

A história de Jack é o mote de "Do Inferno", HQ de Alan Moore e Eddie Campbell. Publicada originalmente na Inglaterra entre 1989 e 1996, em fascículos, a série saiu em partes também no Brasil. Agora, ganha versão completa e de capa dura, com quase 600 páginas, pela Veneta.

Reprodução
Reprodução de ilustração do livro 'Do inferno', de Alan Moore e Eddie Campbell
Reprodução de ilustração do livro 'Do inferno', de Alan Moore e Eddie Campbell

Chamado de "Orson Welles" dos quadrinhos, Moore é também autor dos cultuados "V de Vingança" e "Watchmen", e baseia a trama de "Do Inferno" na hipótese de que as cinco mortes foram, na verdade, uma conspiração para esconder o nascimento de um herdeiro ilegítimo do trono britânico.

"Do Inferno" entrou na lista de mais vendidos do "The New York Times", recebeu os principais prêmios do mundo dos quadrinhos e é considerada uma das melhores graphic novels da história.

A trama, que chegou aos cinemas em 2001, vai virar uma série produzida pelo canal FX no ano que vem, mas ainda sem data de estreia.

Apesar da edição caprichada, seguida por extenso material de apoio, alguns leitores reclamaram de problemas de revisão na HQ ("bela trabalho", "isso porque tinha o sangue encharcou as roupas", "às meia-noite"). Os erros foram corrigidos já na primeira reimpressão.

Em dois meses, "Do Inferno" vendeu 11 mil exemplares e está na quarta tiragem.

O PIOR DOS TEMPOS

Para sua versão da história de Jack, Moore realizou uma extensa pesquisa bibliográfica e visitou Whitechapel com frequência. Por meio de seus relatos, ultrapassamos as rígidas convenções sociais da Londres vitoriana e andamos por becos sujos e sombrios, onde mulheres vendiam o corpo por alguns trocados.

O roteiro de Moore relata como o progresso transformou as cidades e a perspectiva de comunidade. Herdeiros da Revolução Industrial, esses londrinos expunham avanços e fraturas de uma sociedade em transformação.

Mais do que a dramatização de uma série de crimes, "Do Inferno" coloca os assassinatos do "Estripador" como catalisadores para o que viria no século 20. Neles, estariam as sementes da violência urbana e do fascínio moderno pelos crimes em série, alimentado pelos tabloides.

Assim, a construção dos personagens esconde um universo de nuances e segundas intenções. E o legista sinistro, a jovem ingênua e o detetive frustrado dizem muito sobre como as relações se guiam por luzes e sombras.

Nos traços de Campbell, os detalhes daquela Londres são mais sólidos do que os personagens, trêmulos e inconstantes. Se a ficção policial tornou suspeito qualquer londrino caminhando em uma rua escura, a luz trepidante da cidade captada pelo artista parece lembrar que nada é o que parece.

NA TV

O canal de TV norte-americano FX está adaptando os quadrinhos "Do Inferno" para uma série de TV.

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Poucos detalhes foram divulgados, mas, segundo informações publicadas pelo site da revista "Variety", a ideia é manter a adaptação o mais fiel possível à versão original.

A Fox já adaptou a HQ de Alan Moore e Eddie Campbell antes, só que para o cinema. Em 2001, com direção de Albert e Allen Hughes e produção de Don Murphy (que deve produzir também a série), estreou o filme protagonizado por Johnny Depp e Heather Graham.

Foi a primeira adaptação de uma história em quadrinhos de Moore para os cinemas, e a primeira da qual reclamou horrores. Segundo ele, sua ficção histórica existencialista se transformou num thriller ordinário de suspense.

Nos quadrinhos, Jack, o Estripador, é o protagonista e sua identidade é revelada logo no início. No filme, o foco muda radicalmente: o personagem principal é o inspetor Fred Abberline (Johnny Depp) e a identidade do criminoso só é revelada no final.

DO INFERNO
AUTORES Alan Moore (roteiro) e Eddie Campbell (ilustrações)
EDITORA Veneta
TRADUÇÃO Jotapê Martins
QUANTO R$ 94,90 (592 págs.)


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