Folha de S. Paulo


Crítica: Grotesco, 'A Entrevista' retrata ditador norte-coreano como bebê

Alvo de um grupo de hackers autointitulado Guardiões da Paz e ameaçado de cancelamento pelo próprio estúdio que o produziu, o filme "A Entrevista" transformou-se no longa imperdível do ano.

A história de dois jornalistas que tentam assassinar Kim Jong-un, ditador da Coreia do Norte, entrou em cartaz em cerca de 300 salas dos EUA nesta quinta-feira (25).

No dia anterior, foi disponibilizado para aluguel e compra em diversas plataformas online –ainda não há previsão para estreia no Brasil.

Apesar do ódio dos hackers em relação ao filme –segundo relatórios passados à imprensa americana por investigadores, eles agiram em nome do governo da Coreia do Norte–, o ditador Kim Jong-un teria ganho mais sem a confusão.

"A Entrevista" faz humor tão exageradamente grotesco que o retrato do "líder supremo" passaria como brincadeira de crianças de boca-suja.

A começar pela primeira cena, em que uma garotinha norte-coreana canta um hino anti-americano: "Acima de tudo, desejamos que os EUA explodam em uma bola infernal/ Eles são arrogantes e gordos/ Estúpidos e malvados/ Morra, América, Morra". Não há nenhuma sátira política minimamente inteligente.

Na primeira menção direta a Kim Jong-un, apresentadores de TV o apelidam de "Hitler moderno" ao noticiar que o país oriental teria mísseis nucleares capazes de atingir a costa oeste dos EUA.

Ao descobrirem que o ditador é fã de seu programa (e da série "The Big Bang Theory"), Dave (James Franco) e o produtor Aaron (Rogen) conseguem armar uma entrevista com o político em Pyongyang, capital da Coreia do Norte.

O ditador é mostrado como um bebê chorão com problemas de autoafirmação gerados pelo desprezo do pai, Kim Jong-il (1941-2011).

"Ele me chamava de incompetente. Sabe o que é mais destrutivo que bombas nucleares? Palavras", confessa. A estreia nos cinemas dos EUA atraiu pessoas que disseram apoiar a decisão da Sony de recuar e garantir o lançamento do filme.

Os diretores do longa, Seth Rogen e Evan Goldberg, também responsáveis pelos aloprados "Superbad - É Hoje!" (2007) e "É o Fim" (2014), compareceram à sessão lotada na noite de Natal em um cinema de Los Angeles, onde agradeceram aos fãs pelo apoio.

Com a polêmica, os ingressos para muitas das sessões se esgotaram um dia antes.

Conheça os momentos mais controversos de "A Entrevista":

1) Ao conhecer o apresentador Dave Skylark (James Franco), Kim Jong-un é retratado como um moleque mimado: exibe sua coleção de carros importados, entre eles um tanque russo "doado por Stalin". Dentro do veículo, o ditador confessa ser fanático pela cantora pop Katy Perry (da Sony Music, parte do conglomerado de mídia que produziu o filme) e pergunta se "margaritas são gays?"

2) Aos 56 minutos, Jong-un joga basquete em uma quadra com cestas baixas e revela a Dave que "possui ânus e que ele está fazendo trabalho extra", desmentindo a imagem de deus passada para o povo da Coreia do Norte.

3) No meio de uma orgia regada a maconha, álcool e mulheres nuas, o ditador beija o personagem de Franco na boca.

4) A general do exército norte-coreano vira a casaca e questiona: "Kim Jong-un é cruel como o pai e o avô, mas muitas pessoas o veem como deus. Como você fala para 24 milhões de cidadãos que seu deus é um assassino e um mentiroso?"

5) Kim Jong-un aparece pelado preparando-se para a entrevista.

6) O ditador é morto em seu helicóptero, prestes a disparar foguetes contra os Estados Unidos. A cena já estava circulando na internet há algumas semanas e foi motivo de controvérsia até ser amenizada pelos cineastas.

7) Uma reportagem na TV fala do "começo de uma revolução" e das "primeiras eleições democráticas" na Coreia do Norte depois da morte de Kim Jong-un. Segundo a CIA, um grupo de rebeldes estaria disposto a abrir o país para o mundo.


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