Folha de S. Paulo


Mostra revela força da pintura de Burle Marx

Na obra plástica de Roberto Burle Marx, mesmo as composições mais abstratas parecem ter raízes em coisas muito concretas, como plantas que crescem num jardim.

Quando pintava, o artista e paisagista, morto aos 84, há 20 anos, parecia ter em mente as formas espontâneas que brotavam dos campos, desenhos calculados na planta mas ao mesmo tempo sempre sujeitos às variações imprevisíveis da natureza.

Uma mostra agora na Pinacoteca do Estado revê as pinturas de Burle Marx em primeiríssimo plano, na tentativa de apontar como a potência plástica de seus bosques e composições urbanas, como o desenho do calçadão de Copacabana, no Rio, têm raiz numa obra pictórica sólida e em nada secundária.

"Ele foi um pintor muito consistente, forte e interessante", afirma Giancarlo Hannud, curador da mostra.

Divulgação
'Guaratiba', tela de 1989 de Roberto Burle Marx, agora em mostra na Pinacoteca do Estado
'Guaratiba', tela de 1989 de Roberto Burle Marx, agora em mostra na Pinacoteca do Estado

Mas essa faceta acabou eclipsada, talvez pela exuberância dos projetos paisagísticos que arquitetou. De fato, é a experiência concreta da vida de seus jardins que parece moldar toda a construção de suas pinturas.

Mesmo em obras do início da carreira, nos anos 1940, Burle Marx sujeita suas composições figurativas ao caos de formas incertas, com rostos afogados em avalanches vegetais, trepadeiras que se alastram por todo o desenho.

Rostos, aliás, ressurgem como totens primitivos em algumas telas dos anos 1980, como indícios de uma vida pulsante por trás da geometria.

Sua planta para o jardim do palácio Gustavo Capanema, no Rio, um guache de 1938, também parece ganhar vida própria como composição abstrata e independente, além do fato de servir de mapa estratégico de uma paisagem.

Nas telas que fez ao longo dos anos 1960 e 1970, duas forças antagônicas se digladiam. São campos de geometria rígida atravessados por formas orgânicas, em alusão indireta às forças incontroláveis da natureza que tentava domar.

"Há um encontro do dionisíaco com o apolíneo", compara Hannud. "A estrutura rígida e cartesiana vai sendo desmontada pelas linhas soltas e as curvas do barroco."

Essas estruturas são todas tomadas por cores vibrantes, às vezes estridentes, como um rosa-choque que atravessa camadas mais densas de um verde escuro. É como se Burle Marx evocasse ali um caos primordial –e kitsch– à espreita da ordem arquitetônica.

ROBERTO BURLE MARX
QUANDO abre neste sábado (29), às 11h; de ter. a dom., das 10h às 17h30; qui., até 22h; até 22/3
ONDE Pinacoteca, pça. da Luz, 2, tel. (11) 3324-1000
QUANTO R$ 6; grátis aos sábados


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