Folha de S. Paulo


Crítica: 'Teletema' mostra força das trilhas de novelas

Talvez seja difícil para alguém mais jovem entender o papel de formação musical que a televisão fazia nos tempos pré-internet. Um aspecto muito particular dessa história são as trilhas de novela.

Numa época em que a cultura urbana se desenvolvia, que a televisão homogeneizava nacionalmente as referências (processo em que a Rede Globo foi central) e o próprio mercado de música caminhava para seu ápice comercial, as trilhas tiveram um papel importante.

E não fizeram nada feio. Quase toda boa música nacional –e parte da internacional– passou por elas. O gosto musical de quem tem entre 40 e 60 anos quase certamente foi formado também assim. É essa memória que o livro "Teletema", de Guilherme Bryan e Vincent Villari, aborda com detalhismo e precisão.

Divulgação
Francisco Cuoco e Regina Duarte na novela 'Selva de Pedra' (1972), cuja trilha sonora é abordada no livro
Francisco Cuoco e Regina Duarte em 'Selva de Pedra' (1972), cuja trilha sonora é abordada no livro

Trio Azymuth, Banda Black Rio, Marcos Valle, Tom Zé, Egberto Gismonti e mesmo Hermeto Pascoal (com o Quarteto Novo) estavam entre os grandes escalados para compor, ou ceder, temas para as trilhas.

Uma história curiosa é a das duas peças experimentais do maestro Marlos Nobre que foram incluídas à revelia do compositor no meio da trilha de "Selva de Pedra" (1972), sendo oficializadas e creditadas depois.

No auge do luxo, na década de 70, Caymmi, Tom Jobim, Paulinho da Viola, João Bosco, Vinícius e Toquinho, Roberto e Erasmo, Raul e Paulo Coelho, entre outros grandes nomes, eram convocados para preparar material inédito.

A partir de 1971, eram os contratados da gravadora Som Livre (criada pela Globo), como Djavan e Alceu Valença, que eram lançados e "trabalhados" nesse veículo.

Para organizar a abordagem, Bryan (autor do livro "Quem Tem um Sonho Não Dança "" Cultura Jovem Brasileira nos Anos 80") e Villari (roteirista de séries e novelas, como "Os Maias" e "Ti-ti-ti") dividiram a obra em dois volumes. O primeiro e mais importante (1964-1989) é o que sai agora.

TÓPICOS

Todas as novelas e séries nacionais aparecem em tópicos, em ordem cronológica, e há blocos de entrevistas e análise na abertura de cada parte/época. Dessas introduções emergem as figuras centrais de cada período, como Nelson Motta, Guto Graça Mello e João Araújo.

Os erros e acertos deles têm total organicidade com as melhores e piores fases vividas pela música brasileira nas últimas cinco décadas.

Entre as breves entrevistas, há as de dramaturgos como Silvio de Abreu e Gilberto Braga, de produtores e de músicos como Nonato Buzar (autor do tema "Verão Vermelho", com Elis, de 1969), César Camargo Mariano, Lulu Santos (que foi "caçador de canções" para as novelas da Globo no fim da década de 1970) e Julio Medaglia.

O problema para a consulta de "Teletema" é a falta de um índice onomástico –por uma boa razão: ele teria o tamanho de um outro volume. Isso será resolvido com a criação do índice num site, tele temalivro.com.br, em 2015.

Dará para descobrir em quais trilhas está Caetano Veloso, campeão nacional de aparições como compositor e intérprete (mais de cem). Também será uma boa ideia organizar um índice dos títulos das novelas em ordem alfabética, e não só cronológica.

Não à toa, o título do livro é uma homenagem à balada psicodélica de Antonio Adolfo e Tibério Gaspar, gravada por Regininha para a novela "Véu de Noiva" (1969), que foi a ruptura com os dramalhões à moda antiga.

TELETEMA - A HISTóRIA DA MÚSICA POPULAR ATRAVÉS DA TELEDRAMATURGIA BRASILEIRA
AUTORES Guilherme Bryan e Vincent Villari
EDITORA Dash
QUANTO R$ 69 (512 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo


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