Folha de S. Paulo


Exposição lembra os cem anos da morte de Augusto dos Anjos

Para um poeta com um só livro —"Eu", de 1912, ampliado oito anos depois no póstumo "Eu e Outras Poesias"—, pode-se dizer que o paraibano Augusto dos Anjos (1884-1914) chega multiplicado ao centenário de sua morte: entre boas edições impressas e caça-níqueis digitais, mais de dez casas mantêm hoje o poeta em seus catálogos.

Mas não é com entusiasmo que o meio editorial lembra hoje um dos maiores e mais inclassificáveis poetas do país, autor de versos célebres como "um urubu pousou em minha sorte" e "escarra nessa boca que te beija!".

Publicado em 1994 pela Nova Aguilar e reimpresso até 2004, o mais cuidadoso volume em torno da obra do poeta, "Augusto dos Anjos - Obra Completa", organizado por Alexei Bueno, está disponível só para quem der a sorte de encontrar algum remanescente à venda nas livrarias.

Neste ano, a Nova Aguilar passou da Nova Fronteira para a Global, que planeja recolocar o título no mercado apenas em 2016. A mesma Global tem uma das boas edições à disposição hoje, "Melhores Poemas", com seleção de José Paulo Paes.

Reprodução
Retrato do poeta paraibano Augusto dos Anjos
Retrato do poeta paraibano Augusto dos Anjos

Outras, como a da José Olympio, com estudo crítico de Ferreira Gullar, seguem em catálogo, segundo a editora, embora estejam indisponíveis em praticamente todas as livrarias virtuais.

Nesse cenário, coube à Casa das Rosas, em São Paulo, a maior homenagem à data, com a mostra "Esdrúxulo: 100 Anos da Morte de Augusto dos Anjos", aberta ao público nesta quarta (12). O título refere-se ao crítico Anatol Rosenfeld, que definiu seu trabalho como "paroxítono, esdrúxulo, dissonante".

Com 29 poemas, diversos manuscritos e documentos, além de vídeos sobre o poeta, a mostra busca resgatar sua obra centenária a partir de três grandes temas: a morte, as ciências e a transformação permanente da vida.

"A dificuldade de sua poesia está associada aos temas escatológicos, ao vocabulário denso, com termos técnicos e científicos, e à linguagem estranha, incomum na poesia brasileira", diz o curador, Julio Mendonça.

Um dos documentos, uma declaração de 1977 assinada pelos filhos, encerra uma disputa de décadas entre a Cruz do Espírito Santo (PB) natal de Augusto dos Anjos e a mineira Leopoldina (MG), onde morreu aos 30 anos. O termo determina que fiquem nesta última os restos mortais do poeta.

A casa onde Augusto dos Anjos viveu os últimos cinco meses de vida, em Leopoldina, é hoje um pequeno museu onde ficam seus manuscritos –e um único objeto pessoal, uma colher, que segundo a filha pertenceu a ele.

Sem direito aos restos mortais, a paraibana Cruz do Espírito Santo cuida da parte que lhe cabe. Há pouco, iniciou a poda e revitalização do pé de tamarindo eternizado em versos como "no tempo de meu Pai, sob estes galhos/ como uma vela fúnebre de cera/ chorei bilhões de vezes com a canseira/ de inexorabilíssimos trabalhos".

ESDRÚXULO
QUANDO a partir desta quarta (12), de ter. a sáb., das 10h às 22h; dom. e fer., das 10h às 18h; até 1°/3/2015
ONDE Casa das Rosas, av. Paulista, 37, São Paulo, tel. (11) 3285-6986
QUANTO grátis


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