Folha de S. Paulo


Tricô feito por presidiários ganha lugar na São Paulo Fashion Week

Laranja não é lá uma cor muito em voga na passarela. Mas, a depender do estilista paulistano Valdemar Iódice e da mineira Raquell Guimarães, ele vai dar o tom da coleção de inverno 2015 da grife Iódice, um dos destaques da 38ª edição da São Paulo Fashion Week, que começa nesta segunda-feira (3) no Parque Villa-Lobos, em São Paulo.

Após dois anos afastada do evento, a grife volta a desfilar no calendário de moda paulistano no melhor estilo "Orange Is the New Black" ("Laranja é o Novo Preto", série do Netflix que conta a vida de mulheres em um presídio dos EUA).

Oito detentos de penitenciárias de segurança máxima em Minas Gerais, com penas que ultrapassam os 20 anos de cárcere, produziram 20 peças de tricô para a nova coleção da Iódice.

Eles fazem parte do projeto Flor de Lótus, criado em 2009 por Raquell Guimarães, cujo objetivo é ensinar aos detentos de um presídio de Juiz de Fora e um de Belo Horizonte técnicas de tricô e crochê para incluí-los socialmente.

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Detentos do projeto Flor de Lótus tricotam roupas para a grife Iódice
Detentos do projeto Flor de Lótus tricotam roupas para a grife Iódice

Segundo Guimarães, que é dona da grife Doisélles e mantém contrato com os dois presídios para a produção das peças de sua marca, "os presos com maior pena são os que melhor trabalham".

"As mãos masculinas também são ótimas para esse trabalho porque produzem uma trama mais larga e bonita no tricô", diz ela.

FORA DA PASSARELA

Quatro desses oito homens envolvidos no projeto viriam a São Paulo para participar do desfile na próxima quarta-feira (5). Eles tricotariam peças de roupa na entrada da passarela e, ao fim do desfile, seriam escoltados até um presídio paulistano, onde dormiriam até o dia seguinte.

No entanto, a burocracia para liberá-los dos presídios de Minas, transportá-los com escolta até São Paulo, arranjar espaço em um presídio e entregá-los de volta não foi concluída à tempo.

"É um processo demorado. A ideia é mostrar como a moda pode transformar e dar emprego a pessoas que não produzem nada e que podem dar um retorno à sociedade", diz Valdemar Iódice.

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Croqui da grife Iódice com casaco produzido por presidiários. As roupas, muitas delas plissadas e feitas de seda e couro, são inspiradas na tribo africana Wodaabe
Croqui da grife Iódice com casaco produzido por presidiários. As roupas, muitas delas plissadas e feitas de seda e couro, são inspiradas na tribo africana Wodaabe

Ele mesclou as peças de tricô, crochê e macramê produzidas pelos detentos com outras roupas de sua coleção, inspirada na tribo africana Wodaabe e que tem um total de 30 looks.

Iódice, que em 2015 completa 70 anos, é o estilista da SPFW com a carreira mais longeva. "Precisava voltar a desfilar. Já havia uma cobrança dos clientes para que a Iódice desfilasse", diz.


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