Folha de S. Paulo


Cinema francês decepciona, diz expoente do filme de arte

"Os filmes franceses são decepcionantes, os menos interessantes e importantes já feitos desde o surgimento da nouvelle vague [cujo auge foi nos anos 1960]." Este é o diagnóstico de Marin Karmitz, 75, fundador da MK2, lendária produtora e distribuidora de cinema autoral/de arte.

Neste ano, a empresa que já produziu mais de cem filmes e tem cerca de 500 em seu catálogo —dentre os quais de Chaplin e Truffaut— completa 40 anos e será homenageada na Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, que exibe 25 de seus longas (veja destaques ao lado).

Além disso, a MK2 é uma grande exibidora, que possui cerca de 60 salas de cinema na França e acaba de comprar um circuito na Espanha.

Divulgação
O produtor franco-romeno Marin Karmitz no final dos anos 1960
O produtor franco-romeno Marin Karmitz no final dos anos 1960

Em entrevista de seu escritório em Paris, Karmitz disse à Folha que pretende adquirir salas no Brasil. "Estive em São Paulo há um ano procurando salas para comprar, mas estamos com dificuldades em encontrar, é uma cidade muito grande", afirmou o franco-romeno, nascido em Bucareste e que na infância emigrou com a família para a França. "Espero que encontremos algo em breve."

A empresa, hoje dirigida pelos filhos de Karmitz, deu uma pausa, há dois anos, na produção de filmes, investindo agora só em venda de direitos de exibição e distribuição.

O circuito MK2 foi o responsável, na França, por introduzir uma ideia de salas de cinema que oferecessem ao frequentador outras atividades, como restaurantes e livrarias. Karmitz conta que pôde ver no Brasil que muitos exibidores aderiram ao seu modelo.

Contra o fechamento constante dos cinemas de rua, sua fórmula é buscar bairros onde não existam cinemas ou onde eles estejam abandonados. "Encontrei lugares muito bonitos, como uma garagem de barcos. É um trabalho muito complicado, mas que é preciso fazer se se quer guardar um espírito de cinema diferente do que podemos encontrar nos multiplex."

CRISE DO AUTOR

Karmitz reacendeu a polêmica sobre a crise do cinema francês ao criticar o Festival de Cannes este ano na mídia francesa. Declarou ao jornal "Le Figaro" que, embora o cinema comercial e o de autor sempre tenham coexistido no país, hoje todos baixaram de nível. Para ele, os filmes franceses buscam se aproximar dos americanos, e o cinema autoral se repete.

"Para ser cinema de autor é preciso ser um autor, e o que é ele? É um criador que faz e produz obras diferentes das de seus predecessores", diz.

"É aí que se coloca a questão do cinema moderno: quais são os realizadores e em quais países temos hoje autores capazes de trazer uma pedra ao edifício do cinema?"

Mas ele não nega que existam altos e baixos em toda parte. "Há momentos em que o cinema iraniano, ou americano, tem cineastas importantes, e outros em que é fraco, então surgem outras cinematografias inesperadas, como a chinesa ou a indiana."

Ele se declara um amante do cinema sul-americano e conta que, ao alugar sua primeira sala de exibição, "para aprender o ofício", o primeiro filme que mostrou foi o boliviano "El Coraje del Pueblo" (1971), de Jorge Sanjinés. Mas, para ele, a ditadura em países como o Brasil e o Chile afetou o cinema na região.

Karmitz, que foi assistente de Gordard e de Agnès Varda, também dirigiu filmes, como o "Sept Jours Ailleurs" (1969), que será exibido na Mostra.

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DESTAQUES DA MK2 NA MOSTRA DE SP

A Trilogia das Cores: "A Igualdade é Branca", "A Fraternidade é Vermelha" (1994) e "A Liberdade é Azul" (1993)
de Krzysztof Kieslowski

O Vento nos Levará (1999)
de Abbas Kiarostami

"Atirem no Pianista" (1960)
de François Truffaut

"Melô" (1986)
de Alain Resnais

"Salto nel Vuoto" (1980)
de Marco Bellocchio


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