Folha de S. Paulo


Em sua primeira instalação com vídeo, Adriana Varejão revela influências

Quando Adriana Varejão fica diante de sua primeira instalação em vídeo, seus cabelos cor de cobre ecoam o tom do véu de uma Nossa Senhora mestiça, de ancas largas e lábios grossos, que surge na projeção. Seus produtores sacam celulares e correm para fotografar a cena.

Essa visão pronta para o Instagram sintetiza o momento em que a artista usa o vídeo para revelar o que está por trás de sua obra, mostrando imagens de igrejas barrocas do Rio, de Salvador e de Minas Gerais em quatro telas enormes no Oi Futuro, no Rio.

Varejão, 49, quer tornar explícito como, desde os anos 1990, conquistou o público e a crítica com uma releitura visceral do barroco brasileiro —visceral porque suas pinturas costumam ser rasgadas ao meio para revelar órgãos e entranhas ensanguentados.

Debaixo de uma superfície exuberante, está sempre um mundo de desordem e violência. É esse mundo, que passa pelas igrejas de Ouro Preto, em Minas Gerais, pelas louças da Companhia das Índias e pela mistura de raças no Brasil, que ela tenta retratar.

E agora é como se estivesse despindo sua obra diante do público. Neste ano, Varejão escreveu um livro com a antropóloga Lilia Moritz Schwarcz em que analisa cada elemento visual de sua pintura. Em sua nova mostra, cria um painel vertiginoso de ícones barrocos, filmando em plano contínuo as paredes, o chão e o teto dessas igrejas.

"Sempre fiquei muito tempo dentro desses lugares para olhar os detalhes, os arabescos, as cornucópias", diz Varejão, sentada no chão do museu. "Isso tudo fala de forma, exuberância, volúpia."

Mas sua obra desloca todo esse excesso visual para uma realidade contemporânea. Daí ela chamar de "epifania" a hora em que a câmera dentro da igreja da Terceira Ordem de São Francisco, no Rio, passa pela porta e revela os arranha-céus lá fora, quebrando o clima barroco.

"Faço mesmo esse contraponto entre barroco e contemporâneo", diz Varejão. "É algo que também aparece nos cortes da minha pintura."

Zo Guimaraes/Folhapress
Adriana Varejão diante de sua projeção
Adriana Varejão diante de sua projeção "Transbarroco", no Rio

SERENIDADE E VERTIGEM

Uma dessas telas, com fendas numa textura de azulejos revelando um fundo em carne viva, foi leiloada em Londres há três anos por quase R$ 3 milhões, levando Varejão ao olimpo do mercado.

Surgia ali uma sintonia real entre a opulência do barroco em suas obras com o preço que elas passaram a atingir.

No entanto, nem isso nem a atual condição de celebridade das artes visuais parecem abalar a artista. Varejão fala com serenidade e olha firme nos olhos de seu interlocutor para esboçar respostas sempre sedutoras, mas nunca muito precisas.

"Em vez de ir direto ao ponto, as metáforas substituem a comunicação direta", diz Varejão. "Isso é o barroco."

É uma vertigem verbal também em sintonia com a realidade de sua obra plástica. Na sala escura do museu, as telas não estão presas às paredes. Elas pendem do teto em ângulos oblíquos, com imagens que se movem em direções opostas, criando uma desorientação perturbadora.

"Essa procura da vertigem é uma questão constante", diz Varejão. "Eu nasci assim."

O jornalista viajou a convite do Oi Futuro.

ADRIANA VAREJÃO
QUANDO abertura nesta segunda (18), às 19h; de ter. a dom., das 11h às 20h; até 26/10
ONDE Oi Futuro, r. Dois de Dezembro, 63, Rio, tel. (21) 3131-3060
QUANTO grátis


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