Folha de S. Paulo


Crítica: Ambiciosa, mostra 'artevida' se torna asséptica e fria

A gênese da hoje chamada arte contemporânea teve início no final dos anos 1950, especialmente por meio de artistas que buscaram vincular arte e vida, fosse pelo uso do corpo, dando início às perfomances, fosse usando a estética como uma plataforma de transformação social.

É justamente esse momento o foco da mostra "artevida", com curadoria de Adriano Pedrosa e Rodrigo Moura, em quatro espaços do Rio de Janeiro: o Museu de Arte Moderna, a Casa França-Brasil, a Escola de Artes Visuais do Parque Lage e a Biblioteca Parque Estadual.

Trata-se de uma exposição ambiciosa, que traça um panorama da produção experimental dos anos 1950 até os anos 1980 de mais de cem artistas das Américas, Ásia, Europa e África, muitos deles desconhecidos no Brasil, como o palestino Abdul Hay Mosallam ou a turca Gülsün Karamustafa.

Thales Leite/Divulgação
Obra da japonesa Tsuruko Yamazaki, que integra a mostra 'artevida', em exibição no Rio
Obra da japonesa Tsuruko Yamazaki, que integra a mostra 'artevida', em exibição no Rio

Em cada espaço, há um tema dominante, mas os dois que merecem destaque são o corpo, na Casa França-Brasil, com 63 artistas, e a política, no MAM, com 52.

Para reunir um grupo tão amplo e de tantas origens, há uma pesquisa de fôlego. A originalidade da mostra, aliás, está em dispor tal diversidade em torno da produção brasileira. Muitas foram as exposições que focaram esse período e seu caráter experimental, mas poucas apresentaram, como ocorre no Rio, obras de Hélio Oiticica, Lygia Clark e seus contemporâneos.

Ambos estão representados com obras que possibilitam a interação do público, como os "Parangolés", de Oiticica, que podem ser vestidos, ou os "Bichos", de Clark, que podem ser manipulados.

MOLDURAS

O problema é que, dentro desse amplo escopo, a interação com as obras é exceção. Ao expor obras realizadas em um período conturbado, como o dos artistas latino-americanos sob regimes de ditadura e com obras de forte caráter de protesto, "artevida" resulta elegante demais.

Com obras em molduras sofisticadas, que transformam o caráter político desses trabalhos em mero objeto de consumo, a mostra se torna asséptica e fria.

Será que o típico formato para o mercado acaba sendo o destino da chamada arte experimental —ou foi apenas falta de ousadia curatorial? O fato é que, para uma mostra que se chama "artevida", há arte demais para pouca vida.

ARTEVIDA
ONDE Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, av. Infante dom Henrique, 85, parque do Flamengo, tel. (21) 3883-5600; Casa França-Brasil, r. Visconde de Itaboraí, 78, tel. (21) 2332-5120; Escola de Artes Visuais do Parque Lage, r. Jardim Botânico, 414, tel. (21) 3257-1800; Biblioteca Parque Estadual, av. Presidente Vargas, 1.261, tel. (21) 2332-8647
QUANDO ter. a sex., das 12h às 18h; sáb. e dom., das 11h às 18h; até 21/9
QUANTO grátis
AVALIAÇÃO regular


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