Folha de S. Paulo


Depois das grifes de luxo, marcas populares são alvo de pirataria

A marca catarinense Dudalina acaba de comemorar com liquidação a meta de 50 milhões de camisas vendidas em cem lojas. Carro-chefe da empresa, a peça faz sucesso entre as classes B e C.

Ao mesmo tempo, na sobreloja de um shopping de produtos falsificados que funciona no centro de São Paulo, a vendedora K. diz vender, por ano, 72 mil réplicas de camisas com a etiqueta da marca. Cada uma custa R$ 45, quando a peça original custa em média R$ 200.

A Dudalina engrossa a lista de marcas nacionais dessa faixa de mercado que nos últimos dois anos têm sido alvo de falsificações. Ao todo, segundo a Federação do Comércio paulista, a moda no país perde R$ 6 bilhões por ano com pirataria.

Se há cinco anos as réplicas de grifes internacionais como Louis Vuitton, Lacoste e Ralph Lauren eram as mais procuradas, agora as cópias de óculos escuros da Mormaii e da Evoke, dos jeans Cavalera e das camisas Dudalina também estão entre as mais vendidas, segundo o Fórum Nacional de Combate à Pirataria e também conforme conversas com revendedores do Box 31, ponto no primeiro andar de um prédio azul na rua 25 de Março, na região central de São Paulo.

No lugar, atua um "puxador", encarregado de conseguir novos clientes dispostos a comprar vestuário pirata no atacado. Ele fica parado em um banco da rua esperando lojistas interessados. "Só encontra quem procura de verdade", diz ele.

"Agora, a Aramis [marca de moda masculina] é a novidade. Estão pedindo muito porque [os apresentadores] Celso Portiolli e Rodrigo Faro estão usando", diz a empresária S., do Box 31.

Num espaço com pouco mais de 6m² ela estoca pelo menos 500 réplicas de camisas de marcas brasileiras em diferentes tamanhos. No corredor da mesma sobreloja, concorrentes vendem bonés, tênis, calças e camisetas.

"Se levar mais de seis calças Cavalera posso dividir no cartão. Mais de cem, posso tentar fazer preço especial", diz F. em outro box.

Segundo o chefe da Divisão de Repressão e Combate ao Contrabando e Descaminho da Receita Federal, Alan Towersey, esses revendedores são "soldadinhos rasos" do crime organizado.

"Hoje focamos nossa ação nas estradas e em lugares distantes do centro, onde as apreensões de peças chegam a encher um caminhão."

Após a reportagem se identificar, vendedores do depósito clandestino se recusaram a falar. Entre as marcas, só a Dudalina atendeu aos pedidos de entrevista.

NÚCLEOS ANTIPIRATARIA

Apesar de a legislação brasileira prever pena de até quatro anos de prisão para quem vende e compra produtos pirateados, não há sinais de melhora no cenário do comércio ilegal no país.

Segundo a Federação das Indústrias do Comércio do Estado do Rio, o Brasil é o quarto país na lista dos 53 piores ambientes para a propriedade intelectual e o combate à falsificação.

Pesquisa do Datafolha mostra que, em 2013, 61% da classe alta consumiu algum produto pirateado.

Isso leva marcas e associações comerciais a fazer "justiça com as próprias mãos".

A grife catarinense Dudalina, por exemplo, investiu mais de R$ 1 milhão em um núcleo antipirataria dentro da empresa e, de acordo com sua presidente, Sônia Hess, já apreendeu, em parceria com a Receita Federal, mais de 300 mil camisas falsificadas.

Composto por 12 pessoas, entre advogados e funcionários internos, esse núcleo também já tirou da internet 52 mil links de produtos Dudalina pirateados. "Na rede vendem até tênis, que nunca produzimos", diz Hess. "Infelizmente gastamos dinheiro legal para combater a ilegalidade."

A Abióptica (Associação Brasileira da Indústria Óptica) conseguiu, com o apoio de marcas de óculos, apreender 5 milhões de óculos falsificados em 2013.

Os itens estão em primeiro lugar no ranking dos objetos mais pirateados no Brasil em 2012, segundo levantamento do Fórum Nacional de Combate à Pirataria. Naquele ano, foram comprados quase R$ 20 bilhões em óculos pirateados.

"As cópias estão mais sofisticadas e com um nível de detalhamento que assusta. Os da Mormaii, por exemplo, vêm até com a bandeira do Brasil impressa na parte interna", afirma o diretor da Abióptica, Bento Alcoforado.

No segmento da moda, segundo Alcoforado, as confecções ao poucos deixam a capital e se pulverizam em cidades do interior de São Paulo, Rio e Minas Gerais.

"Os óculos, por exemplo, chegam na alfândega sem a marca ou desmontados. Isso dificulta a análise dos oficiais aduaneiros pois não se sabe ao certo o fim daqueles produtos. Liberados, muitos são finalizados em uma fábrica especializada", diz o executivo.

Para Alcoforado, o índice de pirataria "diminuiria se as marcas se comprometessem a registrar a propriedade intelectual de todos os seus desenhos", facilitando o reconhecimento dos itens falsificados e, posteriormente, o aceleramento de processos judiciais.

REGISTRO GERAL

A diretora de marcas do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, Silvia Freitas, diz que as grifes brasileiras só são copiadas porque o mercado de moda nacional se desenvolveu e é desejado.

Ela frisa que, se tratando do design de roupas, é possível registrar estampas e interferências estéticas no objeto, como linhas e formas únicas.

O problema maior, no entanto, acontece quando o nome da marca não é registrado.

"Isso possibilita alterações na nomenclatura dos nomes costurados nas peças. Os donos ficam expostos a fraudes e podem ter longos processos judiciais para recuperar a marca se alguém registrar antes", diz Freitas. (PEDRO DINIZ)


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