Folha de S. Paulo


Debate de escritores 'queridinhos' decepciona com discussão didática

A terceira mesa da Flip reuniu dois dos "queridinhos" da festa literária em 2014. A neozelandesa Eleanor Catton e o suíço Joël Dicker têm muito em comum. Ambos são jovens (28 anos) e ganharam fama com livros que são verdadeiros calhamaços (beirando as 800 páginas). São também, como disse o mediador da mesa José Luiz Passos, "desavergonhadamente bem sucedidos".

Catton recebeu no ano passado o Man Booker Prize pelo romance "Os Luminares"; foi a escritora mais jovem a vencer a honraria, o principal prêmio literário dos Estados Unidos. Dicker encantou críticos e público em diversos países com "A Verdade sobre o Caso Harry Querbet".

Por tudo isso, a mesa dos dois era uma das mais aguardadas da Flip. Acabou decepcionado um pouco, por ficar demais concentrada na análise da estrutura dos romances. O mediador até brincou que estava parecendo mais uma aula de pós-gradução. Em outro momento, disse, aos risos, que o curador da Flip (Paulo Werneck) pedia mais sangue na mesa.

Os livros dos dois convidados possuem elaborada estrutura narrativa, mesclando mistério, alternância de tempo e de vozes narrativas.

O debate sobre isso consumiu grande parte da mesa.

Catton disse que seu livro, sobre a corrida do ouro em uma pequena cidade do século 19, baseou-se na astrologia.

"Eu formatei a narrativa em tornos de mapas estrelares. Cada personagem segue um arquétipo, segundo o movimento dos planetas a partir dos signos do zodíaco. Fiquei surpresa em descobrir como é matemático e o zodíaco."

Já Dicker comentou que o crime de seu livro, o assassinato de uma garota de 15 anos, é só um pano de fundo para mostrar a visão de mundo dos personagens.

"Não é sobre um crime, mas sobre como as pessoas enxergam a vida. Eu faço a estrutura de acordo com a verdade de cada um. Acontece que não há uma única verdade. Há a verdade de cada personagem."

Num dos pouco momentos mais descontraídos, Dicker contou ter ficado surpreso com a quantidade de pessoas no auditório.

"Não esperava essa multidão para nos ouvir —e não são meus pais ou meus parentes", disse, sob intenso aplauso do público.

Outro momento mais forte ocorreu quando Catton reconheceu que a tradutora francesa de seu livro apontou vários erros na trama. Um casaco, por exemplo, estava sem gola em uma página e com gola na página seguinte.

"A minha tradutora francesa é maravilhosa. Eu fico feliz com essas pequenas correções. As pessoas não leem ficção para buscar fatos, mas para buscar a verdade, o que é completamente diferente." O público também aplaudiu fortemente nesse momento.


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