Folha de S. Paulo


Fotógrafo Robert Mapplethorpe tem mostras simultâneas em Paris

Mapplethorpe e Rodin. O fotógrafo americano e o escultor francês se encontram agora no Museu Rodin, em Paris, numa exposição que põe em choque os limites desses dois territórios da arte.

Enquanto o fotógrafo, morto aos 42, há 25 anos, entrou para a história por tratar a pele de seus retratados como mármore, Rodin, morto aos 77 em 1917, transformou o bronze em pele, como se suas esculturas fossem dotadas de uma vida além dos moldes.

No meio desse caminho, entre corpos reais que lembram a estoicidade da pedra e corpos de mentira com a organicidade da carne, Rodin e Mapplethorpe parecem quase feitos um para o outro.

Também alvo da maior retrospectiva já dedicada a sua obra, com mais de 200 peças reunidas no Grand Palais, Robert Mapplethorpe é revisto agora para além das imagens chocantes à época de sua criação, como cenas de sadomasoquismo e sexo que extrapola qualquer convenção.

De fato, Mapplethorpe chocou e ainda choca. No Grand Palais, uma das salas é reservada a maiores de idade, como se as imagens ali fossem exemplares da pornografia e não das artes plásticas.

Mas uma revisão em curso agora deixa em segundo plano a imagem do fotógrafo como "enfant terrible" do submundo nova-iorquino e dá lugar à sua percepção como um quase escultor neoclássico, que no lugar de uma broca usava uma lente fotográfica.

"Ele sempre dizia que se tivesse nascido 200 anos antes seria escultor", diz Jérôme Neutres, curador da mostra no Grand Palais. "Ele era obcecado pelas formas do corpo, como Michelangelo era."

E como Auguste Rodin também. Essa obsessão fica ainda mais fica clara em contraponto às peças do escultor no museu parisiense, como os efeitos de drapejado nas esculturas, que encontram eco nas imagens que Mapplethorpe fez com homens e mulheres enrolados em tecidos.

Nesse ponto, Rodin consegue parecer às vezes mais fotógrafo do que Mapplethorpe, já que fazia questão de incorporar a percepção do movimento às suas figuras esculpidas. Mesmo estáticos, congelados em bronze, seus homens parecem se contorcer ou avançar rumo a um destino.

Mapplethorpe, ao contrário, buscava congelar suas figuras humanas na perenidade do registro fotográfico, usando a câmera como espécie de Medusa, a personagem da mitologia grega que transformava homens em estátuas.

Muito além de Rodin, sua obsessão em retratar certas partes do corpo, de seios femininos ao pênis dos homens, beira os procedimentos de escultores como o romeno Constantin Brancusi, que de tanto depurar os traços transformava bustos de mulheres em totens cegos, sem olhos nem expressão.

Em chave metonímica, Mapplethorpe parecia fazer o mesmo com seus homens, focando uma só parte do corpo, em especial o sexo, para retratar o todo, e buscando ali sempre a rigidez do mármore.


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