Folha de S. Paulo


Mestre da arte cinética Abraham Palatnik faz retrospectiva

Quando criou seu "Aparelho Cinecromático", Abraham Palatnik abriu um terreno resplandecente entre a escultura e a pintura. Essa obra, uma tela luminosa com formas coloridas que se movimentam como peixes num aquário, causou enorme espanto quando surgiu na primeira Bienal de São Paulo.

Isso porque, em 1951, ressuscitou parte da linguagem da pintura, técnica em vias de esgotamento diante da avalanche da arte conceitual, e deu novos contornos à escultura, que deixava de ser estática pelas mãos do artista.

Palatnik, 86, agora tema de uma ampla retrospectiva no Museu de Arte Moderna, é desde então um dos maiores nomes da chamada arte cinética, corrente estética ancorada na luz e no movimento.

Nesse ponto, a mostra reflete as duas frentes de sua obra —de um lado, trabalhos com peças que se mexem de verdade, e, do outro, obras que provocam a ilusão de movimento, com efeitos ópticos.

Depois de estudar engenharia na Palestina, onde passou a juventude, na virada dos anos 1930 para os 1940, o artista nascido em Natal foi viver no Rio, onde acabou tendo contato com os internos do hospital psiquiátrico do Engenho de Dentro.

Quando viu as pinturas de pacientes como Emgydio de Barros e Raphael Domingues, agora também na mostra, Palatnik abandonou a figuração em suas obras e passou a perseguir uma abstração quase sempre vibrante e luminosa.

Suas máquinas de cor e luz, como o "Aparelho Cinecromático" e seus "Objetos Cinéticos", com esferas coloridas que lembram planetas em órbita, parecem ser a junção de sua experiência como mecânico e a fúria arrebatadora que viu nos quadros dos internos do Engenho de Dentro.

"Não tem muito mistério", diz Palatnik. "É só a luz em movimento. Queria uma coisa dinâmica, e não estática."

DESAFIO AO ESTÁTICO

Mesmo obras sem motores e dispositivos elétricos, como pinturas sobre ripas de madeira ou com recortes de papel, desafiam o estado estático.

Palatnik constrói até hoje essas composições feitas da junção de duas pinturas distintas cortadas em tiras e rearranjadas num mesmo plano. É como se orquestrasse um ruído intencional de cores, intercalando planos de tons berrantes e complementares.

Seus relevos em papel causam o mesmo impacto, mas não pela cor. Ali, são volumetrias brancas alinhadas na mesma superfície, causando um efeito de vibração pelas diferenças de forma e tamanho.

"Isso é uma das coisas mais sagazes na obra dele", diz Felipe Scovino, um dos curadores da mostra no MAM. "Sempre fica essa indistinção difusa entre pintura e escultura."

Mas não resta dúvida que Palatnik faz tudo isso com as mãos, por mais exuberante que seja seu projeto plástico. Talvez esteja aí grande parte da força de seu trabalho, que atravessou décadas sem se pasteurizar ou resvalar em táticas de linha de montagem.

"Sua obra é uma invenção muito ligada à manufatura", diz Scovino. "Desde muito cedo na vida, ele vem fazendo esse alargamento da pintura, que não está morta."

ABRAHAM PALATNIK
QUANDO abre nesta quarta-feira (2), às 20h; de ter. a dom., das 10h às 17h30; até 15/8
ONDE MAM, pq. Ibirapuera, portão 3, tel. (11) 5085-1300
QUANTO R$ 6


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