Folha de S. Paulo


Brasileiros fazem sucesso no exterior com o design da diversidade

Mais de 20 anos depois de seu lançamento, a Favela, cadeira dos Irmãos Campana feita com sarrafo de madeira, ainda é a grande referência mundial do design feito agora no Brasil. Só que não é mais a única.

Uma "jovem guarda" na faixa dos 30 colhe reconhecimento no exterior ao aplicar novas tecnologias e materiais inusitados em suas criações.

Gente como os designers Brunno Jahara, Carol Gay, Guto Requena, Henrique Steyer, Jader Almeida e Zanini de Zanine, que expõem fora do país, vendem para Europa e EUA e fecham parcerias com marcas estrangeiras.

"Sinto que há hoje um interesse muito grande pelo design brasileiro, em proporção que nunca tinha sentido antes. Há essa nova safra do design industrial, mas também outra vertente, mais social, com comunidades artesanais", diz Adélia Borges, curadora e professora de história do design.

O design contemporâneo brasileiro é influenciado por mestres como Lina Bo Bardi (1914-1992), Sergio Rodrigues e os Campana, mas sua marca maior é a diversidade.

Para fazer a cadeira Nóize, o paulista Guto Requena, 34, digitalizou o projeto da cadeira Girafa, de Bardi e, com um software, o fundiu ao desenho de ondas de som captadas na rua Santa Ifigênia,no centro de São Paulo.

O resultado é uma peça única, impressa em 3D, exposta em vários países e que chega em novembro ao MAD (Museum of Arts and Design), em Nova York.

"Tenho dado muitas aulas fora do país. Há grande interesse sobre o novo design e a nova arquitetura brasileiros", diz Requena.

"Nosso trabalho desperta curiosidade porque fazemos muito com pouco. Você vê uma escola de samba, acha que tem estrutura gigante. Mas, a decoração do carro alegórico é feita com papel de brigadeiro", ele acrescenta.

A paulista Carol Gay, 38, usa borracha reciclada da indústria de pneus e cintos de segurança em seus móveis. "Aprendi com os Campana a valorizar materiais banais. A ideia é dar novo valor funcional e estético", diz ela, representada pela James Gallery, em Paris, que expõe e vende seus produtos na Europa.

Essa preocupação também está na obra do carioca Brunno Jahara, 35, que usa plástico e madeira reciclados.

O designer vende no exterior por meio da loja L'Arcobaleno, com escritórios na Alemanha e nos EUA. Alguns de seus móveis, como os dos Campana, lembram o improviso das favelas brasileiras.

"Ainda usam a favelização porque há o sentimento de que isso funciona, de que vende", diz Adriana Kertzer, assistente de curadoria do MAD e autora do livro "Favelization". "Mas estou interessada em pessoas que adotam linguagem supranacional, levando o discurso para além de estereótipos brasileiros."

Sem tradição acadêmica, o design brasileiro é moldado pela diversidade cultural.

"Não temos a rigidez europeia, não preciso cumprir uma cartilha. Aqui se faz de tudo, móvel sério, produtos mais irreverentes. Nossa característica é a liberdade", diz Henrique Steyer, 34.

A irreverência é levada a sério no trabalho desse gaúcho, que lançou em 2013 a coleção "É o Bicho", com peças em formatos de animais.

Neste ano, ele lançou sua coleção assinada pela Florense, marca brasileira de móveis que distribui para EUA, México e Nova Zelândia.

Na ponta mais séria, as referências a modernistas como Sergio Rodrigues e Joaquim Tenreiro aparecem mais nas obras de Zanini de Zanine e Jader Almeida.

Filho do arquiteto e moveleiro Zanine Caldas (1919-2001), Zanini, 35, acompanhou, na faculdade, o trabalho de Rodrigues por um ano.

"Se fosse resumir o desenho brasileiro em duas palavras, diria que é quente e informal. Mas o que mais me atrai é a diversidade que nosso vasto território e nossa miscigenação nos oferecem", diz o carioca, que produz para a italiana Cappellini.

O catarinense Almeida, 32, começou a trabalhar na indústria de móveis aos 16. Desde 2004, desenvolve produtos para a indústria Sollos e entrou no ano passado para a equipe da alemã ClassiCon.

"Tenho preocupação com a escala, a proporção e a combinação de materiais. Não tenho um traço que segue algum estereótipo. Busco perenidade no design", diz.


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