Folha de S. Paulo


Coleções privadas ganham mais espaço nos museus

Uma mocinha chorando, pintada no estilo das histórias em quadrinhos pelo artista pop norte-americano Roy Lichtenstein, já não está sozinha num quarto em Paris. A tela esteve no Museu de Arte Moderna do Rio e agora está em exposição no Masp.

Ela faz parte da enorme coleção de Sylvio Perlstein, brasileiro radicado na Europa, que acumulou um acervo do melhor da arte surrealista à contemporânea, passando pelo minimalismo, o conceitualismo, o pop e tudo de mais relevante no século 20.

Perlstein está fazendo uma espécie de turnê de seu acervo pessoal. Suas obras deixam as salas de sua casa parisiense e ganham os museus.

Divulgação
'Crying Girl', tela de Roy Lichtenstein de 1964, no Masp
'Crying Girl', tela de Roy Lichtenstein de 1964, no Masp

Ele também não está sozinho nesse movimento. O megacolecionador Sérgio Fadel, advogado que mantém seu acervo no Rio, está mostrando alguns tesouros da arte construtivista brasileira agora no Museu de Arte Moderna paulistano, com obras de estrelas como Lygia Clark, Hélio Oiticica, entre outros.

No início deste ano, Sérgio Carvalho, advogado de Brasília, também levou uma parte de sua coleção de mais de mil obras de jovens artistas brasileiros ao Paço das Artes.

VAIDADE

"Isso é uma tendência", aponta Jones Bergamin, dono da Bolsa de Arte, maior casa de leilões do país. "Quem tem obras importantes acha bom mostrar num museu. Existe certa vaidade nisso."

Mais ou menos vaidosos, colecionadores também sabem que uma vez que a obra é mostrada num museu respeitado no circuito, como o MAM, elas ganham mais "peso institucional" —ou seja, acabam se valorizando.

"Detesto falar em dinheiro e não ganho nada com isso", diz Perlstein. "É um grande erro comprar arte como ações na Bolsa, pensando em quanto aquilo vai valer no futuro."

Exposições mais frequentes de obras raríssimas, como as de Perlstein e Fadel, também acabam evidenciando lacunas nos acervos dos museus do país, que estão longe de reunir peças desse calibre.

Luiz Camillo Osorio, um dos curadores da exposição com obras de Perlstein, diz que "cabe a cada museu avaliar a força e escala institucional" desses acervos privados.

"Sempre tivemos a coleção aberta para ser visitada em casa, mas isso tira um pouco da nossa liberdade", diz Fadel. "A melhor maneira de mostrar é num museu."

Na mesma linha, Carvalho, que só coleciona obras do século 21, ainda não viu valores atingirem a estratosfera, mas busca chamar atenção para as peças na tentativa de criar seu próprio museu no futuro.

"É obrigação do colecionador mostrar as suas obras", diz Carvalho. "Ele acaba ocupando o espaço que deveria ser do poder público. É o Estado que deveria montar acervos. Tem dinheiro para tudo, mas não tem para a cultura."

OBRAS ENQUADRADAS

Esse aumento no número de exposições de acervos privados nos museus também coincide com um momento em que coleções particulares estão na mira do governo.

Um decreto do ano passado do Instituto Brasileiro de Museus, órgão do Ministério da Cultura, dá carta branca à União para declarar como bens de interesse público obras de colecionadores privados, que teriam sua venda e circulação monitoradas.

Embora num primeiro momento houvesse receio de colecionadores em mostrar ou emprestar suas obras, com medo que entrassem para a lista oficial, o quadro vem se invertendo com base no fato de que uma coleção visitável não está sujeita à nova lei.

"Não tenho medo de expor. A coleção já é pública, já rodou muito", diz Fadel. "Isso não vai nos atrapalhar."

A INUSITADA COLEÇÃO DE SYLVIO PERLSTEIN
QUANDO abre nesta quinta (5), às 19h; de ter. a dom., das 10h às 18h; qui., até 20h; até 10/8
ONDE Masp, av. Paulista, 1.578, tel. (11) 3251-5644
QUANTO R$ 15

VONTADE CONSTRUTIVA NA COLEÇÃO FADEL
QUANDO de ter. a dom., das 10h às 17h30; até 15/6
ONDE MAM, pq. Ibirapuera, portão 3, tel. (11) 5085-1300
QUANTO R$ 6


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