Folha de S. Paulo


Crítica: Atriz Diane Keaton ri de si mesma em memórias

Uma vez noiva nervosa, para sempre nervosa noiva. Ao longo de sua carreira (e vida fora da tela), Diane Keaton parece nunca ter abandonado o estilo charmosamente desajeitado que caracterizava Annie Hall, personagem de Woody Allen que lhe deu o Oscar de melhor atriz em 1978.

Continuou vestindo blusas de gola olímpica, coletes, gravatas e sapatos de bico. Principalmente, continuou não se levando muito a sério e não tendo medo de rir de si mesma. E fazendo das piadas uma reflexão sobre o mundo, sobre os costumes de nosso tempo.

Assim é seu mais recente livro, "Let's Just Say It Wasn't Pretty", de memórias e pontificações sobre a vida, a beleza e o envelhecimento. Lançado nos EUA no final do mês passado, chegou à lista de mais vendidos do "New York Times", apesar de não trazer fofocas suculentas.

A confissão mais "quente", digamos, é sobre o momento em que viu o seu "primeiro pênis", ainda adolescente, numa praia.

Paul Drinkwater/Reuters
A atriz Diane Keaton apresenta homenagemao diretor Woody Allen na cerimônia do Globo de Ouro, em janeiro
A atriz Diane Keaton apresenta homenagemao diretor Woody Allen na cerimônia do Globo de Ouro, em janeiro

Não houve nada de erótico, ela apenas entrou sem avisar na barraca onde um amigo do pai estava trocando de roupa. Mas o momento marcou a menina de então: "Foi tão rápido que não deu para ver detalhes. Mesmo assim, tenho de dizer que o poder de seu pênis me deixou com uma pontinha de inveja".

Agora, aos 68 anos, tem outras coisas com que se preocupar. "Meu corpo está despencando", constatou ela, ao "cometer o erro" de se olhar no espelho depois de um banho. Para Diane, o jeito é enfrentar filosoficamente, aprender a conviver com as rugas e a bunda caída.

O tema perpassa todo o livro. Por sinal, o título vem de um momento em que as operações de embelezamento eram tema de conversa familiar. Ao ver uma foto de Dean Martin, antes da plástica no nariz, a mãe de Diane fez o comentário: "Vamos dizer apenas que não era bonito".

Quanto a ela mesma, afirma: "É preciso força para assumir suas imperfeições. As pessoas me perguntam por que nunca fiz plástica. A verdade é que eu respeito tanto as mulheres que fizeram quanto as que não fizeram".

Suas "imperfeições" são o motor do livro. Fala mal dos cabelos, das orelhas, dos pés, do estilo que pinta os olhos, mas sempre dá a volta por cima, mostrando como convive com cada suposto defeito e faz o melhor com o que tem.

Conta momentos de seus relacionamentos (amorosos e/ou profissionais) com Woody Allen, Warren Beatty, Jack Nicholson e Al Pacino ("Tentei de tudo para fazer dele um marido; falhei. O que aprendi? Nunca se apaixone pelo Poderoso Chefão").

Compartilha suas paixões —vícios talvez seja a melhor palavra, que ela mesma usa. Por exemplo: comprar casas, reformá-las e vendê-las —nem sempre com lucro.

Sua vida doméstica também toma grande parte do livro. Sempre com um tom de humor autodepreciativo: "Não acredito que fui descalça buscar meu filho na escola". Mas também de orgulho, como quando fala das habilidades esportivas da filha.

De vez em quando, sai-se com uma tirada filosófica sobre a velhice: "Para nós, que fomos separados da vida real pela fama, envelhecer é uma experiência niveladora".

Assim, com um sorriso, uma lágrima, uma gargalhada ou um nariz franzido, conquista o leitor como seduziu os que a acompanham na telona ou na telinha ao longo desses mais de 40 anos em que se expõe ao público porque queria "ser amada por grandes grupos de gente".

LET'S JUST SAY IT WASN'T PRETTY
AUTOR Diane Keaton
EDITORA Random House
QUANTO cerca de R$ 40 na Amazon (224 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo


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