Folha de S. Paulo


Roberto Carlos diz que não entrará na Justiça contra livro de seu biógrafo

O cantor Roberto Carlos não entrará na Justiça contra o livro "O Réu e o Rei", de autoria do jornalista Paulo Cesar de Araújo. A obra conta a história da batalha judicial em torno da biografia "Roberto Carlos em Detalhes" (ed. Planeta), publicada em 2006 e retirada das livrarias após acordo judicial entre autor, editora e músico.

A decisão sobre o novo livro de Araújo foi anunciada nesta sexta-feira (30) por meio de nota enviada à imprensa pelo advogado de Roberto, Marco Antônio Campos.

"Com relação ao livro 'O Réu e o Rei', Roberto Carlos não vai tomar qualquer medida jurídica, em face de: a) o livro não ser uma biografia sua, mas uma autobiografia do autor; b) ao contrário do livro anterior, não conter invasão de sua privacidade e/ou injurias ou difamações a sua pessoa. O livro 'Roberto Carlos em Detalhes' não foi censurado ou apreendido, mas saiu do mercado em face de um acordo judicial, irrevogável e definitivo, assinado espontaneamente pelo autor do livro, o editor e a Editora", diz a nota divulgada pelo advogado de Roberto.

Segundo Campos, ele e outros advogados de Roberto leram o livro, lançado na quarta-feira (21), durante a semana e prepararam um parecer para o cantor. Em 2007, Roberto alegou na Justiça que a biografia "Roberto Carlos em Detalhes" invadira sua intimidade, acionando o autor e a editora nas esferas cível e criminal.

Em resposta ao comunicado enviado por representantes de Roberto, a editora de "O Réu e o Rei" enviou a nota: "A Companhia das Letras considera o livro de Paulo Cesar Araújo, 'O Réu e o Rei' –com o relato da pesquisa e dos passos que fizeram com que a biografia de Roberto Carlos fosse retirada do mercado– um marco na história da luta pela liberdade de expressão no Brasil, e em particular da luta pela liberdade de publicação de biografias e livros que retratem a história do nosso país. Como todos os editores, aguardamos agora que o Senado dê continuidade à tramitação do Projeto da nova Lei das biografias".

SEM ALARDE

Livro
O Réu e o Rei
Paulo Cesar de Araújo
O Réu e o Rei
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"O Réu e o Rei" chegou às livrarias sem a habitual divulgação de obras do tipo, como divulgação prévia para a imprensa, propaganda ou festa de lançamento, uma estratégia para evitar que os advogados de Roberto Carlos se adiantassem ao lançamento.

O livro é o segundo colocado na lista de livros mais vendidos de não ficção. A obra teve tiragem inicial de 30 mil cópias. Em uma semana, mais 15 mil livros foram colocados em circulação pela editora. A Companhia das Letras não divulga o número de vendas.

Hoje é possível barrar biografias feitas sem a autorização de biografados ou herdeiros por meio de dois artigos do Código Civil. A Câmara aprovou neste mês um projeto que permite a publicação de biografias sem autorização. O texto seguiu para o Senado e, caso seja aprovado, vai à sanção presidencial.

A discussão sobre a necessidade de autorização prévia para esse tipo de obra também corre no Supremo Tribunal Federal. Há duas semanas, Roberto Carlos entrou no tribunal em defesa dos artigos, alegando que garantem o direito à privacidade.

Em "O Réu e o Rei", Araújo conta que, segundo Roberto, o biógrafo é um usurpador da história alheia, "como se a história de uma figura pública não pertencesse também à coletividade nem fosse de interesse geral".

O debate em torno das biografias não autorizadas voltou à discussão no fim do ano passado, quando Roberto e outros músicos, como Caetano Veloso, Chico Buarque e Gilberto Gil, declararam-se a favor da norma vigente, ou seja, da brecha na lei que permite a proibição de biografias que não tenham sido autorizadas por biografados ou seus herdeiros.

TRECHOS

O juiz Tércio Pires nos recebeu de pé com os promotores Fausto Junqueira de Paula e Alfonso Presti. A escrevente Silvana Mori também já estava lá.
Antes de sentar, todos se cumprimentaram apertando as mãos - o que não aconteceu entre mim e Roberto Carlos. Não por indelicadeza, mas pelo lugar que logo ocupamos na sala. O cantor se posicionou do lado direito do juiz, enquanto eu fui para o esquerdo, ficando do outro lado da mesa de reunião. Para haver o aperto de mão, precisaríamos dar uns três passos em direção ao outro, mas nem eu nem ele tomamos a iniciativa. Exatamente nesse instante me lembrei de um verso de "Pensamentos", uma de suas canções pacifistas, que diz: "Quem me dera que as pessoas que se encontram/ Se abraçassem como velhos conhecidos/ Descobrissem que se amam/ E se unissem na verdade dos amigos".

"Você escreveu que eu participei de orgias com garotas menores no apartamento de Carlos Imperial! Você me chamou até de covarde neste livro!"
Nesse momento tive certeza de que o cantor não havia lido a biografia. Qualquer leitor de "Roberto Carlos em Detalhes" sabe que ali não existem essas acusações. Respondi: "Roberto, você talvez seja a única pessoa que viu isso no meu texto. Nem mesmo seu advogados que aqui estão acreditam que escrevi tais coisas sobre você".

Roberto Carlos nada falou sobre o Brasil, sobre o governo Lula, sobre o papel dos Estados Unidos no mundo. É assim desde que ele despontou para o sucesso, há mais de 40 anos. Como não gosta de falar de política e também não se interessa por filosofia, economia, sociologia ou literatura, os temas de suas entrevistas costumam ficar restritos basicamente à sua vida pessoal e a alguns aspectos da carreira. Foi o que aconteceu mais uma vez nesse depoimento ao "Fantástico", em que, para justificar a censura a um livro, argumentou que "privacidade é uma coisa fundamental em ser protegida".

Extraídos de "O Réu e O Rei"


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