Folha de S. Paulo


Diretor recupera entrevista esquecida de Nise da Silveira em documentário

Uma entrevista com a psiquiatra alagoana Nise da Silveira (1905-99), feita pelo diretor Leon Hirszman (1937-1987), que estava esquecida nos arquivos da Cinemateca Brasileira, em São Paulo, se transformou em "Posfácio - Imagens do Inconsciente", filme que chega hoje ao Festival É Tudo Verdade, pelas mãos de Eduardo Escorel.

Nise revolucionou a psiquiatria no Brasil, ao introduzir a terapia ocupacional para os esquizofrênicos como forma de resgate da realidade, através da expressão artística e do trabalho manual.

Pioneira no estudo e divulgação da psicologia de Carl Jung, Nise também criou o Museu de Imagens do Inconsciente, destinado à preservação dos trabalhos produzidos em suas oficinas.

Divulgação
Nise da Silveira na entrevista que resultou em 'Posfácio
Nise da Silveira na entrevista que resultou em 'Posfácio'

Hirszman ("Eles Não Usam Black Tie") já havia dirigido a trilogia "Imagens do Inconsciente", baseada em pesquisas de Nise sobre os doentes e o trabalho artístico que desenvolviam.

PRECIOSIDADE

Muito próximo de Hirszman, Escorel afirma, a respeito de "Posfácio", que "se trata de material que adquiriu o status de preciosidade arqueológica". "O negativo original se perdeu, só existia uma cópia em 16 mm e o áudio completo." A entrevista foi feita em duas etapas, nos dias 15 e 19 de abril de 1986.

Um ponto alto do documentário está na montagem. Além da entrevista, Escorel também recupera trechos do áudio de Nise que não foram filmados e intervenções em off de Hirszman, com ou sem a câmera ligada.

Vários momentos são também pontuados por uma tensão no ar, relacionada à necessidade de economizar filme. "Naquela época, era sempre um pânico, o que mais se ouvia durante as filmagens eram frases do tipo 'corta o mais rapidamente possível, antes que os negativos acabem'", lembra Escorel.

Ele vê três grandes qualidades no filme: ineditismo, por se tratar de raro registro audiovisual de Nise; a exposição da dinâmica entre ela e Hirszman; e a descrição de questões cruciais para a psiquiatra —a terapia ocupacional e a reabilitação de doentes vindos de unidades psiquiátricas.

Luiz Carlos Mello, que trabalhou com Nise por 26 anos e atualmente dirige o Museu de Imagens do Inconsciente, participou das filmagens. Ele conta que a entrevista era o ponto de partida para um trabalho mais abrangente que abordaria o círculo vicioso do doente que fica confinado no hospital sem acesso a uma vida social e familiar.

"Depois que ele recebia alta, quase sempre retornava. Esse índice era de 70%. Era preciso quebrar este círculo, e o filme seria sobre isso."

Se cabe uma crítica ao filme, é à ausência de uma pesquisa de campo que pudesse contextualizar a obra de Nise ou um olhar sobre sua influência na psiquiatria hoje.

Mas não se pode exigir tudo de um só filme. E, nos créditos, quem aparece como diretor é Hirszman, reforçando a ideia de que o recorte está situado na edição de uma entrevista com 98 minutos filmados de duração.

POSFÁCIO - IMAGENS DO INCONSCIENTE
DIREÇÃO Leon Hirszman
PRODUÇÃO Brasil, 1986-2014
QUANDO hoje, às 20h
ONDE Centro Cultural Banco do Brasil, r. Álvares Penteado, 112, tel. (11) 3113-3651
QUANTO grátis
CLASSIFICAÇÃO 12 anos


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