Folha de S. Paulo


Morre aos 90 anos o historiador francês Jacques Le Goff

Morreu ontem, em Paris, aos 90, o historiador francês Jacques Le Goff, integrante de uma escola de pensamento que renovou o estudo da História no século 20 e influenciou estudiosos também no Brasil.

Le Goff integrou a terceira geração da chamada Escola dos Annales, criada no final dos anos 20 por Marc Bloch (1886-1944) e Lucien Febvre (1878-1956), em torno da publicação "Annales D'Histoire Economique et Sociale".

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O historiador francês Jacques Le Goff
O historiador francês Jacques Le Goff

Em contraposição à chamada "história positivista", vinculada a enumeração de datas de batalhas e revoluções, a biografias de homens notáveis e a predominância do relato dos vencedores, os integrantes do grupo dos Annales se interessaram em apreender os fenômenos chamados de "longa duração".

A isso se referiam ao tratar das transformações das "mentalidades", ou seja, do imaginário dos homens através da história. De um ponto de vista prático, isso significou integrar ao estudo clássico da história, instrumentos e documentos relacionados a antropologia, a arqueologia e a outras ciências sociais.

Le Goff dedicou-se, em linhas gerais, ao estudo da vida material, da relações sociais e transformações intelectuais da Europa nos séculos 12 e 13. Entre seus trabalhos mais importantes, estão "O Nascimento do Purgatório" e as biografias do rei Luis 9º, da França, e de São Francisco de Assis.

Era um defensor da ideia de que considerar o período que vai do século 4 ao 15 como "Idade Média" era depreciativo e sugeria que a época teria sido um período de trevas. Em sua visão, havia sido um tempo de renovação intelectual no período, refletido num novo modo de os ocidentais relacionarem-se com a religião, o dinheiro e o conhecimento, além de transformações do papel da mulher e da organização da família.

Também foi membro e antecessor de Le Goff nessa mesma escola o também francês Fernand Braudel (1902-1985), que nos anos 30 participou do grupo de estudiosos estrangeiros que ajudaria a fundar a escola de humanidades da USP. Por conta disso, o curso de História da universidade paulista manteve como referência o trabalho dos Annales. Le Goff, assim como Phillipe Ariés (1914-1984) e George Duby (1919-1996) foram muito lidos por estudantes.

Em entrevista à Folha em 2001, Le Goff declarou que o movimento iniciado por seu grupo seria completado pela globalização, resultando numa "desocidentalização" da história.

Le Goff mantinha a preocupação de divulgar a história fora do ambiente universitário. Além de um programa na rádio estatal francesa, foi ainda consultor de várias produções para a TV e o cinema, entre elas, "O Nome da Rosa" (1986), baseado em livro de Umberto Eco e estrelado por Sean Connery.


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