Folha de S. Paulo


Crítica: Cerimônia do Oscar foi a mais previsível dos últimos anos

A festa começou um tanto estranha. No tradicional número de abertura, em que o apresentador faz graça com as estrelas da plateia, a em geral competente Ellen De Generes, conhecida por seu humor suave e palatável, soltou piadas um tantinho mais agressivas, possivelmente buscando um tom mais próximo ao de Tina Fey e Amy Poheler, sensacionais na apresentação do Globo de Ouro por dois anos consecutivos. Sem a mesma verve, porém, De Generes mais constrangeu do que divertiu.

No restante da cerimônia, suas piadas foram menos incisivas, mas igualmente infelizes. Um dos trocadilhos envolveu uma brincadeira entre o sucesso "Jogos Vorazes" ("Hunger Games") e o fato de todo mundo passar fome na plateia do Oscar. Uma pizza foi encomendada, pedaços distribuídos, e um chapéu percorreu a plateia para arrecadar dinheiro e pagar a conta. Isso em pílulas espalhadas ao longo da cerimônia. Ellen ainda tirou fotos ao vivo com as estrelas, postou no Twitter e quebrou recordes de "retwit" naquilo que ficou parecendo a maior ação publicitária da história do Oscar.

Bill Murray compensou tanta falta de inspiração com uma homenagem fora do roteiro ao grande Harold Ramis, diretor de "Os Caça-fantasmas" e "Feitiço do Tempo", enquanto apresentava o Oscar de melhor fotografia ao lado de Amy Adams. A menção a Eduardo Coutinho na homenagem aos mortos do ano foi outra ótima surpresa, ainda que não tenha dado tempo - assim esperamos - de incluir Alain Resnais, que morreu no mesmo dia da cerimônia.

A mesma platitude da apresentadora se repetiu na premiação. O que dizer de um Oscar em que "O Grande Gatsby" levou duas estatuetas (melhor figurino e direção de arte) enquanto "O Lobo de Wall Street" e "Philomena" não receberam nem umazinha?

A grande concentração de prêmios para "Gravidade" é plenamente justificável, principalmente pelas conquistas técnicas do filme, que de fato tem um primoroso trabalho na conjugação das possibilidades da fotografia (não só de iluminação, mas também de movimento de câmera e pós produção), montagem, efeitos visuais e sonoros em um grande esforço para reproduzir a sensação de falta de gravidade do espaço sideral. É pena que Alfonso Cuarón não tenha confiado na imensa força da fisicalidade de seu filme e tenha sucumbido a um certo sentimentalismo.

Mesmo com suas limitações, "Gravidade" seria um prêmio de melhor filme bem mais interessante do que para "12 Anos de Escravidão", uma obra que recai em todas as armadilhas da obra "relevante" e aponta um caminho acadêmico para um diretor de trajetória inicialmente interessante como Steve McQueen.

Enfim: esse foi o Oscar mais previsível e pouco emocionante dos últimos anos.


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