Folha de S. Paulo


Cia. Eastman mostra pela 1ª vez no Brasil seu quebra-cabeça multicultural

Ser filho de mãe belga e pai marroquino fez com que o coreógrafo flamengo Sidi Larbi Cherkaoui, 37, se tornasse um catalisador da diversidade e das oposições que encontra no mundo. "O fato de eu ter crescido na Bélgica me deu um senso visual, de pintura, de luz dos pintores belgas, com o qual faço associações em minha dança. E tenho uma influência do idioma do meu pai, o árabe, em especial de sua escrita, muito fluida e caligráfica, que procuro traduzir nos meus movimentos."

Dançarino tardio --começou aos 16 anos--, estreou profissionalmente no fim dos anos 1990, nos grupos de Alain Platel, do Ballets C de la B, e de Anne Teresa De Keersmaeker (que apresentou em SP nos últimos dias 23 e 24 a coreografia Cesena, com a Cia. Rosas).

Criar seu próprio grupo, Eastman, em 2010, foi uma decorrência natural de seu pensamento cênico, que vai muito além da dança e agrega a ela, harmonicamente, linguagens como teatro e performance, com integrantes de regiões tão díspares como Grécia, Índia, Inglaterra e Japão.

"Estou sempre a procura de pessoas como eu, que estão entre duas culturas, que buscam maneiras de ligar elementos distintos. A maior mensagem que essa característica leva ao público é a de que opostos podem se reconciliar e viver juntos. As pessoas precisam dos seus opostos para serem elas mesmas. Sou muito holístico nesse sentido, estou constantemente tentando jogar com diferenças, encontrando harmonia e equilíbrio entre dois extremos."

Assim, não surpreende que entre seus projetos estejam tanto Babel (2010), espetáculo de dança-teatro em colaboração com o artista britânico Antony Gormley (o dos homens de metal espalhados na paisagem urbana pelo CCBB no ano passado), quanto Milonga! (2012-13), em que sintetizou e adaptou o tango argentino em parceria com uma estrela do gênero, a argentina Nelida Rodriguez de Aure. Passando pela coreografia da superprodução cinematográfica "Anna Karenina", que transportou Keira Knightley e Jude Law à corte russa de Leon Tolstói.

Em Puz/zle, espetáculo mais recente de sua companhia, que traz a São Paulo a partir de hoje em sua première na América do Sul, ele suprime a verborragia de Babel em busca de um silêncio rompido apenas pela música do conjunto corso La Filetta, com vocais da libanesa Fadia El-Hage. Na peça-coreografia, as pedras são o elemento que traduz a dureza da luta pela sobrevivência, seja de insetos ou do homem.

"É como se os dançarinos no palco fossem criaturas, formigas tentando achar seu caminho entre as pedras: eles manipulam e constroem coisas com as pedras, e vão lentamente evoluindo até se tornarem humanos, vão adquirindo características particulares. Mas o interessante é que continuam agindo como animais, construindo e desconstruindo."

Em um quebra-cabeça gigante, as rochas evocam imagens de opostos, a exemplo de seu uso em paredes das casas ou na lápide de um caixão. A própria evolução da utilização das pedras, de obstáculo a abrigo ou estátua, vai sinalizando em cena a passagem da História. Para Cherkaoui, as pedras são testemunhas dela, antigas viajantes de seus locais de origem até longínquas paradas. "Tenho sempre essa imagem na minha mente: há muita alma nas pedras porque há muita História nelas."

PUZ/ZLE
CIA. EASTMAN DE SIDI LARBI CHERKAOUI
QUANDO 25 a 27 de outrubro (sex., às 21h30; sáb., às 20h; e dom., às 18h)
ONDE Teatro Alfa - Sala B (rua Bento Branco de Andrade Filho, 722 - Santo Amaro; tel. 0/xx/11/5693-4000)
QUANTO de R$ 40 a R$ 170
CLASSIFICAÇÃO 12 anos


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