Folha de S. Paulo


Ruy Castro diz que pagaria 'dízimo' para escrever sem censura

"Eles querem o dízimo? Eu pago o dízimo, desde que não venham querer interferir no resultado", disse o escritor e colunista da Folha Ruy Castro, ontem, em mesa sobre biografias no pavilhão do Brasil, na Feira de Frankfurt.

Referia-se à proposta, feita pelo grupo Procure Saber, de que os biografados passem a receber porcentagem das vendas de livros que contem suas histórias.

Ruy contou que fez o comentário em café da manhã da delegação brasileira com a ministra Marta Suplicy na última terça, antes da abertura de feira. "Ela disse ter ficado contente por poder ouvir escritores, já que até então só tinha ouvido, repetidamente, como podemos imaginar, o ponto de vista desses artistas que fazem lobby."

Segundo ele, Marta disse estar predisposta a concordar com os argumentos dos escritores, "embora ache que eles [os artistas do Procure Saber] têm razão quando dizem que nós poderíamos pagar uma porcentagem das vendas".

Johan Visbeek/Divulgação
O escritor Ruy Castro em mesa sobre biografia na Feira de Frankfurt
O escritor Ruy Castro em mesa sobre biografias na Feira de Frankfurt

"Se esse for o preço da minha independência, é um caso a se pensar", disse o biógrafo, que só conseguiu publicar sua biografia sobre Garrincha depois de a editora Companhia das Letras fechar um acordo com os herdeiros do jogador. "O que não dá é para eles quererem ler antes da publicação e fazer censura prévia", afirmou.

Questionada na última quarta sobre a conversa com os escritores, Marta disse estar "ouvindo todos os lados".

Para Ruy, os artistas do Procure Saber "promovem uma campanha antidemocrática que pode render frutos porque eles têm poder". "Eles vão ao Congresso e dão autógrafos para deputados, tudo porque Roberto Carlos não quer que ninguém fale sobre a perna mecânica dele."

Ruy argumentou que a proposta afeta não apenas biógrafos mas também pesquisadores, ensaístas, documentaristas, dramaturgos e outros profissionais.

"Herdeiros sempre aparecem, mesmo aqueles que nunca tiveram nada a ver com o personagem retratado. Se vou escrever uma biografia de Getúlio, aparece um sobrinho-neto para embargar. Manuel Bandeira foi famoso por ser solteirão, sem filhos, e daí apareceram sobrinhos querendo proibir tudo. Não tem fim."


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