Folha de S. Paulo


Morre aos 95 o 'sacerdote-artista' Mestre Didi, criador de linguagem com raízes africanas

O artista plástico, escritor, ensaísta e líder espiritual Deoscóredes Maximiliano dos Santos, popularmente conhecido como Mestre Didi, morreu em Salvador aos 95 anos. Ele foi enterrado neste domingo (6), por volta das 17h, no cemitério Jardim da Saudade, no centro da capital baiana.

O artista era famoso por representar elementos da cultura afro-brasileira em suas obras, como os orixás e os exus, temas recorrentes de suas esculturas. Desde a infância, executava objetos rituais e aprendeu a manipular formas e materiais com os mais antigos do culto orixá Obaluaiyê.

Análise: Mestre Didi trabalhava relação entre a cultura popular e a erudita

Além das capacidades de escultor, Mestre Didi também era conhecido por liderar a comunidade espiritual nagô. Ele era filho de Maria Bibiana do Espírito Santo, também chamada de Mãe Senhora, uma das principais mães de santo do terreiro Ilê Axé Opô Afonjá, de Salvador. Em 1985, ele recebeu o título de alaipini, título máximo da hierarquia sacerdotal nagô.

Mestre Didi não costumava falar sobre sua obra nem sobre si próprio. Ele chegou a expor em Gana, Senegal, Inglaterra e França, além do Guggenheim, em Nova York. No Brasil, ganhou reconhecimento após a 23ª Bienal de São Paulo, em 1996, quando recebeu uma sala apenas para suas obras.

Pela Unesco, realizou pesquisas comparativas entre Brasil e África e, em 1980, fundou a Sociedade Cultural e Religiosa Ilê Asipá, do culto aos ancestrais Egun, em Salvador.

Era casado com a antropóloga Juana Elbein dos Santos, que o definia como um "sacerdote-artista", expressando por meio da arte sua cultura, intimamente ligada às tradições africanas. Deixa a filha, a cantora Inaicyra Falcão dos Santos.

"Estive com o Mestre Didi há três dias, ele estava acamado. Ele foi um personagem importante na Bahia, um catalisador do culto aos ancestrais, sendo filho de uma das maiores ialorixás da Bahia, a Mãe Senhora. Era um homem de grande interesse nesse universo afro-brasileiro. Foi um homem extraordinário. É uma perda irreparável, porque sem ele a religião afro-brasileira fica mais empobrecida. Como artista, ele foi muito longe, participou até da mostra 'Magiciens de la Terre', no Pompidou. Ele ganhou prestígio nacional com suas obras. Temos 40 obras dele no acervo do Museu Afro Brasil e pretendo fazer uma grande mostra em homenagem a ele. Ele foi o princípio de uma nova linguagem brasileira com profundas raízes africanas", disse Emanoel Araujo, diretor do Museu Afro Brasil.


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