Folha de S. Paulo


Dois meses após enterro no Grande Recife, Dominguinhos é sepultado de novo no agreste

Dois meses depois de ter sido enterrado em Paulista, na região metropolitana do Recife, o corpo do cantor e compositor Dominguinhos foi levado nesta quinta-feira (26) para um mausoléu em Garanhuns, cidade natal do sanfoneiro.

Por volta das 6h, o corpo do cantor foi exumado para, em seguida, ser conduzido numa limusine preta ao restaurante de comida nordestina "Arriégua", de Luiz Ceará, um dos melhores amigos do artista, no bairro da Várzea, zona oeste do Recife. No local, houve uma bênção para que o caixão seguisse.

No meio da manhã, um cortejo percorreu 230 km até Garanhuns. No caminho, uma multidão se aglomerou às margens da BR-232 para aplaudir.

A exemplo do velório e do primeiro enterro de Dominguinhos, em 25 de julho, a nova despedida também foi ao som de forró. Um palco foi armado próximo ao mausoléu construído pela prefeitura e artistas se apresentaram durante todo o dia.

O caixão com o corpo de Dominguinhos foi sepultado ao som do Hino Nacional por volta das 14h

Morto aos 72 anos vítima de um câncer de pulmão contra o qual lutou por seis anos, Dominguinhos foi primeiro enterrado no cemitério Morada da Paz, depois de um longo embate entre o primeiro filho do sanfoneiro, Mauro Moraes, 53, e a cantora Liv Moraes, filha do artista com Guadalupe Mendonça.

Mauro queria enterrar o pai em Garanhuns. Numa entrevista antiga à Rádio Jornal, do Recife, Dominguinhos afirmou desejar ser enterrado na cidade.

"Se por acaso tu morrer, tu vai para Garanhuns, Santo Amaro [bairro do Recife onde se localiza um cemitério homônimo] ou fica por São Paulo?", perguntou o radialista Geraldo Freire.

"Ave Maria, eu sempre falo de Garanhuns", respondeu Dominguinhos.

Prevaleceu, no entanto, o desejo da outra parte da família de Dominguinhos, que foi enterrado no Grande Recife. Mauro entrou com um pedido de antecipação de tutela na 1ª Vara Cível de Paulista para tentar levar o corpo a Garanhuns.

MATUTO DE GARANHUNS

No final de agosto, a juíza Andréa Duarte Gomes autorizou, em sentença, a exumação e o traslado do corpo de Dominguinhos a Garanhuns. Na decisão, Gomes disse considerar "as fortes raízes de Dominguinhos com seus costumes, sua terra natal, principalmente, o patrimônio cultural envolvido, motivo de regozijo, exultação do povo do agreste".

Ela ainda citou a canção "Matuto de Garanhuns", composta pelo mestre Camarão, uma evidência do "forte laço havido entre Dominguinhos e os costumes do interior".

A letra da canção está na sentença: "Tocou sentindo o cheiro da terra, o aroma das feiras do sertão / mostrou sua arte em grandes centros / Da Europa até o Japão / Foi o matuto de Garanhuns, o maior sanfoneiro da nação / Ei, Dominguinhos, teus amigos cantam em louvação / Músicas do filho de Garanhuns, o maior sanfoneiro da nação / Sua sanfona tinha a leveza do vento da madrugada / Sua voz era tão grave que parecia um trovão / Neném era o filho de Garanhuns, o maior sanfoneiro da nação / Aos amigos deixou saudade de um mestre, grande lição do artista, a simplicidade de quem sempre falou do coração".

Recentemente, os familiares entraram em acordo, e a Prefeitura de Garanhuns construiu um mausoléu para receber o corpo de Dominguinhos.

A administração municipal não informou o quanto gastou na obra, feita em granito, com uma imagem do artista em aço e um trecho da letra de "De Volta para o Aconchego". O mausoléu levou cerca de um mês e meio para ficar pronto.

Durante o enterro de ontem, a filha Liv cantou "De Volta para o Aconchego" e "Eu Só Quero um Xodó".

"Tudo foi feito do jeito que tinha que ser feito. Garanhuns teve tempo de construir um lugar para o meu pai e nós tivemos tempo de fazer um cortejo bonito", diz Liv. "Não tinha necessidade de haver uma ação. Nós também queríamos que ele fosse enterrado em Garanhuns, mas a cidade ainda não estava pronta [ná época da morte de Dominguinhos]."

"[A exumação] é um procedimento estranho de assistir, mas foi para o melhor, foi muito bonito, meu pai ficaria realmente muito feliz."

HOMENAGENS

À Folha, o prefeito do município, Izaías Régis (PTB), afirmou, em agosto, que pretende construir um monumento e um espaço cultural dedicados a Dominguinhos em Garanhuns.

Segundo o prefeito, o espaço cultural seria construído em uma casa tombada do século 19, de propriedade do município de Garanhuns. A casa fica na rua Tobias Barreto, ao lado de um antigo fórum da cidade.

"Seria um espaço de lembrança, e não um museu, das ideias que ele produziu na vida artística. Museu é um termo muito forte", diz. O acervo viria de doações. "Amigos e familiares de Dominguinhos, como a filha Liv, já demonstraram interesse em fazer doações de objetos do músico, como chapéus e discos."

O prefeito também pretende mudar o nome da Esplanada Cultural Guadalajara, espaço destinado à realização de eventos culturais em Garanhuns, para Esplanada Cultural Mestre Dominguinhos.


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