Folha de S. Paulo


Crítica: Carlos A. C. Lemos defende patrimônio de SP de forma simples e profunda

Recentemente, o professor Carlos Lemos denunciou, em um artigo na página 3 desta Folha, uma intervenção indevida no tombado Edifício Esther, o primeiro prédio moderno de São Paulo.

O arquiteto mostrou como é penosa a tarefa de salvaguardar o patrimônio frente à falta de consciência de identidade cultural do nosso povo.

Carlos A. C. Lemos lembra que preservar a arquitetura não é ser saudosista

O incansável professor, aos 88 anos, ainda não se curvou ao desrespeito da memória e mantém firme, nas páginas da imprensa, sua militância em defesa da cidade.

Eduardo Knapp/Folhapress
Carlos Lemos na Vila Penteado (1902), casa 'art nouveau' que abriga a pós-graduação da FAU-USP
Carlos Lemos na Vila Penteado (1902), casa 'art nouveau' que abriga a pós-graduação da FAU-USP

Não fosse do último dia 7, o artigo poderia estar incluído em seu novo livro, "Da Taipa ao Concreto - Crônicas e Ensaios sobre a Memória da Arquitetura e do Urbanismo".

Apresentado pelo arquiteto José Tavares Correia de Lira, o livro de Lemos reúne 53 artigos escritos entre 1972 e 2000 --47 publicados na Folha. A coletânea mostra que nem sempre, como dizia um antigo ditado, o jornal de hoje serve apenas para embrulhar o peixe de amanhã. Muito pelo contrário.

Embora reúna pequenos textos dirigidos a um público não especializado, que dialogaram em seu tempo com situações específicas, em geral ligadas a debates sobre intervenções urbanas, a obra é íntegra, e seu conjunto constitui uma reflexão significativa sobre diferentes aspectos da história de São Paulo --planos e projetos, destruição da memória, ações de preservação do patrimônio e dilemas entre conservar e modernizar.

Com maestria, Lemos traduz sua erudição e acurada capacidade analítica para uma linguagem, ao mesmo tempo, simples e profunda.

O livro revela episódios marcantes do debate urbano nas últimas quatro décadas, como a demolição dos casarões da avenida Paulista.

E também a fúria insensata do metrô que destruiu coisas belas; a torre de 500 metros de altura que a Brasilinvest e o Maharishi Global Development Fund pretendiam erguer no bairro Pari, acolhida pelo prefeito Celso Pitta; e a tentativa de demolição da Igreja de São Cristóvão, entre tantos descalabros.

As análises apresentam uma impressionante atualidade, o que torna o livro fundamental para os interessados na questão urbana ou patrimonial.

Como Lemos destaca na introdução ao volume, sua militância jornalística, se é que assim pode ser chamada, conseguiu salvar importantes exemplares da história da arquitetura paulistana, como o colégio Caetano de Campos, na praça da República, ameaçado de desaparecer sob as obras do metrô, no ritmo modernizador do Brasil grande dos anos 1970.

Esse é apenas um dos muitos embates que Lemos protagonizou nas páginas de meios como a Folha e em que sua atuação não foi em vão.

NABIL BONDUKI é arquiteto e urbanista, professor titular de planejamento urbano na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e vereador em São Paulo.

DA TAIPA AO CONCRETO
AUTOR Carlos A. C. Lemos
EDITORA Três Estrelas
QUANTO R$ 54,90 (304 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo


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