A fotografia, para Jacques Henri Lartigue é, em essência, uma linguagem por meio da qual se pode colocar a lei da gravidade em xeque.
Em suas imagens tudo tende a levitar, fluir, mergulhar, ganhar velocidade, decolar, se desequilibrar e, por fim, escapar do fotograma.
Lartigue, um dos fundadores da fotografia moderna ganha sua primeira mostra no Brasil.
Henri Cartier-Bresson disse que o surrealismo da fotografia se localizava em sua exótica capacidade de congelar cenas em velocidade e nos permitir vê-las estáticas, como o próprio olho humano não é capaz de fazer.
Lartigue percebeu isso cedo e, em suas fotos, realizadas no ritmo de crônica ou de um diário íntimo, gerou uma das mais belas odes à vida, conotando leveza, humor, delicadeza e presença de espírito.
A fotografia como coreografia é a face mais característica do seu trabalho e o que deu atemporalidade às imagens.
O retângulo do visor, por onde o fotógrafo enquadrava as cenas, era como um campo que, para representar enfaticamente a pulsão da vida, deveria ser expandido, se possível implodido, pela composição.
As pessoas, os animais e os objetos que levitam, ascendem ou são flagrados no instante que antecede a quedafiguram sempre como ameaças à integridade da moldura que os aprisiona na foto.
Recurso utilizado para nos fazer perceber o extra-quadro, aquilo que está logo ao lado, mas que a fotografia sonega: metáfora da simultaneidade dos infinitos eventos que ocorrem num só instante.
Não é à toa que a água e o ar estão entre seus principais temas e são priorizados pela curadoria nessa mostra do Instituto Moreira Salles, no Rio. Ambos são signos de fluidez e transitoriedade.
O curioso é perceber como Lartigue, que nunca se preocupou em desenvolver uma obra fotográfica, conseguiu sintetizar, no interior do seus álbuns, conceitos tão precisos, alinhavados por uma poética tocante.