Folha de S. Paulo


Vídeo motivou denúncia contra manifestação do Teatro Oficina em São Paulo

O pedido da instauração de inquérito policial contra a Associação Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona, por causa de uma manifestação na PUC-SP em novembro de 2012, teve como base uma denúncia feita em Anápolis (a 48 km de Goiânia e a 978 km da capital paulista).

O protesto reuniu cerca de 200 pessoas no campus em prol do movimento grevista, que rejeitava a indicação da professora Anna Cintra à reitoria da universidade --ela foi confirmada no cargo em fevereiro. No ato, um boneco do papa Bento 16 era chamado de "Dona Benta" e despedaçado com uma motosserra.

O padre Luiz Carlos Lodi da Cruz encaminhou carta com 442 assinaturas colhidas on-line ao Ministério Público do Estado de São Paulo em nome da associação Pró-Vida de Anápolis, da qual é presidente. Na denúncia, diz que o ato praticado pelo Teatro Oficina se enquadra no artigo 208 do Código Penal, que protege imagens e ritos religiosos e prevê multa ou detenção de um mês a um ano.

O Ministério Público, então, requisitou instauração de inquérito para investigar a encenação do Teatro Oficina no campus de Perdizes (zona oeste) da PUC-SP, em que um boneco de três metros de altura que representava um sacerdote --em referência à Igreja Católica, que administra a universidade-- teve partes do corpo mutiladas até perder a cabeça. O ato foi uma reprodução adaptada da peça "Acordes", em cartaz na época no Teatro Oficina.

Veja vídeo

"[O que ocorreu] foi um ato de gravíssimo ultraje e escarnecimento à pessoa do Papa Bento 16 e à fé católica. Os 'atores' conversam com um boneco de grande tamanho representando o Santo Padre, chamam-no injuriosamente de 'Dona Benta', escarnecem longamente dos Dez Mandamentos e, por fim, simplesmente cortam a cabeça do boneco com uma motosserra", diz o abaixo-assinado.

Uma representante do teatro depôs na 23ª DP (Perdizes), nesta quinta-feira (13), para dar explicações e reconhecer atores que aparecem no vídeo "Decapitando o Papa na PUC", no site Vimeo.

Com bandeiras de luta a favor da "inviobilidade da vida" e contrárias à legalização do aborto, à eutanásia, ao casamento entre homossexuais e ao "hedonismo sexual nos currículos escolares", segundo seu site, a associação diz ser propositora, quando necessário, de ações judiciais em defesa de suas causas. Ela não integra o grupo Pró-Vida, ligado à Igreja Católica.

A denúncia diz ainda que o grupo incorreu em crime previsto no artigo 286 do Código Penal, que se refere à incitação de crimes e prevê multa ou detenção de três a seis meses. A carta afirma que o ato registrado em vídeo incita particularmente ao crime de homicídio.

Adriano Vizoni/Folhapress
Zé Celso durante ato na PUC-SP, em novembro de 2012
Zé Celso durante ato na PUC-SP, em novembro de 2012

"A gravidade do fato aumenta por ter sido praticado dentro de uma universidade pontifícia e às vésperas da chegada do Santo Padre ao Brasil por ocasião da Jornada Mundial da Juventude Rio 2013."

Em resposta à intimação para depor na delegacia, emitida no último dia 24, o diretor do Teatro Oficina, José Celso Martinez Corrêa, publicou uma carta aberta na internet. "Estamos sendo processados mais uma vez pelos que devíamos processar pelo desrespeito ao Teatro e ao Estado Laico Brasileiro", diz. "[O teatro] é o espaço da liberdade total. Nós das artes que lutamos para abolir a censura no Brasil durante a ditadura militar e ganhamos esta conquista, não podemos recuar e aceitar a censura à nossa atividade".

A defesa do Teatro Oficina afirma que a encenação da peça está completamente resguardada pelo direito à liberdade de expressão.

O padre fez ainda outro abaixo-assinado, direcionado ao arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer, em que pede a ele a instauração de sindicância e de processo administrativo contra os autores do que chama de "ultraje" ocorrido na universidade.

Procurado, o padre disse conceder entrevista apenas à imprensa católica.


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