Folha de S. Paulo


No Brasil, crimes de lavagem de dinheiro na arte não tem 'tratamento devido', diz juiz

Embora a lei em vigor no Brasil preveja sanções específicas para o crime de lavagem de dinheiro envolvendo obras de arte, muitos casos acabam sendo ignorados pelas autoridades. Na opinião do juiz federal Fausto De Sanctis, que está lançando um livro sobre esse tipo de crime no meio artístico, a fiscalização no país é pouca e ineficiente.

"Existe uma norma, que obriga galerias, museus, casas de leilões e bibliotecas a manterem um cadastro de clientes por um prazo de cinco anos, nome e endereço completo, dados de documentos. Também diz que as formas de pagamento têm de ser legais, rastreáveis", diz De Sanctis, alertando que outra parte da medida obriga pessoas do meio a comunicar qualquer operação suspeita, caso contrário podem até ser alvo de investigação por cumplicidade com o crime. "O Brasil tem legislação sobre isso, mas não dá o tratamento devido. Ninguém questiona nada."

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Também na opinião do juiz, a interpretação que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras, órgão do Ministério da Fazenda responsável por monitorar essas transações, é muito restrita, alvejando só galerias de arte quando museus e bibliotecas que recebem doações, por exemplo, estariam obrigados a checar a origem de recursos ou obras que passam a integrar seus acervos.

Jones Bergamin, da Bolsa de Arte, uma das maiores casas de leilão no país, que opera em São Paulo e no Rio, diz que mantém controles rígidos sobre seus compradores e que a nota eletrônica da compra é emitida na hora da venda, que também é comunicada a autoridades comerciais. "O leilão pode ser acusado de alavancar preços, mas dizer que se lava dinheiro em venda pública é uma completa ignorância do mercado de arte", diz o leiloeiro. "O rastro que um leilão deixa é o catálogo, é a evidência, é uma prova."

Uma das maiores galerias de arte do país, a Fortes Vilaça também afirma que dá atenção a possíveis tentativas de lavagem de dinheiro. "Sempre procuramos saber quem são nossos clientes e prezamos acima de tudo a integridade em nossas transações", diz Marcia Fortes, uma das sócias da galeria. "Tomamos conta do nosso negócio e não dos negócios alheios. [Mas] como cada um constrói o seu patrimônio e o que cada um faz com ele não cabe a nós discutir."

Mesmo com subterfúgios e estratégias criminosas de todo tipo apontados por De Sanctis em seu livro, que inclui a contratação de laranjas e falsificação de documentos para realizar transações, Fortes diz que, com a crescente profissionalização do mercado no país, "práticas como essas estão cada vez menos possíveis e plausíveis".


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