Folha de S. Paulo


Gabriel García Márquez, o "super-herói colombiano", chega aos quadrinhos

Ao longe, um carro desliza pela estrada de Acapulco, a caminho do mar. Um zoom nos aproxima uma, duas, três, quatro vezes, até chegarmos ao interior do veículo.

Estamos no México, em 1965, e Gabriel García Márquez maneja o volante e conversa com sua mulher, enquanto os filhos fazem algazarra no banco de trás.

É assim que arranca o livro "Gabo - Memorias de una Vida Mágica" (Rey Naranjo Editores, Bogotá, 180 págs.), biografia em quadrinhos do escritor colombiano recém-publicada na Espanha.

É assim, segundo o mesmo livro, que começa a ser criada a obra mais famosa de García Márquez, o romance "Cem Anos de Solidão" (1967).

Divulgação
Ilustração reproduzida do livro
Ilustração reproduzida do livro "Gabo: Memórias de uma Vida Mágica", biografia em quadrinhos de Gabriel García Márquez

Nas páginas seguintes de "Gabo" acompanharemos, quadrinho a quadrinho, o momento em que o escritor é tomado por uma epifania e, no acostamento da rodovia mexicana, encontra a maneira de realizar o romance, que rascunhava desde os 19 anos.

Tomando este mítico ponto de partida, "Gabo" narra desde o nascimento do bebê Gabriel (o cordão umbilical sufocando seu pescoço) até o 8 de dezembro de 1982, quando ele recebeu na Suécia o Prêmio Nobel de Literatura.

"A vida de García Márquez é uma fábula completa. Uma epopeia segundo a qual um garoto de um povoado pobre e periférico se converte num mito literário", defende o editor do livro, John Naranjo, em entrevista à Folha.

É com ênfase nesse diapasão "superação de dificuldades", com atenção especial à infância difícil do autor (não por acaso tema central do livro autobiográfico "Viver para Contar", de 2002), que se desenrola a narrativa.

LIVRO A DEZ MÃOS

O projeto concebido pelo colombiano Naranjo, que fundou há três anos a Rey Naranjo, foi tocado a dez mãos.

Óscar Pantoja assina o roteiro e as ilustrações são de Miguel Bustos, Felipe Camargo, Tatiana Córdoba e Julián Naranjo, jovens quadrinistas baseados em Bogotá. Cada ilustrador abraçou uma fatia da vida de Gabo, como o escritor é apelidado.

Ainda que com vaivéns na história, os blocos correspondem a: 1) infância pobre em Aracataca, cidadezinha onde nasceu; 2) juventude como jornalista em Cartagena e em Bogotá, publicação dos primeiros livros, encontro com a mulher de sua vida; 3) viagens --Cuba, Nova York e México--, casamento, filhos e sucesso literário; 4) glória literária: o Prêmio Nobel.

Naranjo não economiza entusiasmo sobre García Márquez. "É uma obra universal, profundamente poética e atemporal. Tenho certeza de que ele será lido daqui a 400 anos, como o 'Dom Quixote'", sustenta o editor, que chega, como é apropriado ao mundo dos quadrinhos, a compará-lo a Batman, Superman e Homem-Aranha. "É o super-herói colombiano."

A obra, já vendida a alguns países, como a Itália (terra pródiga em biografias em quadrinhos, como as do selo BeccoGiallo), não tem previsão de lançamento no Brasil.

Mas a editora de Gabo no país, a Record, começará a reeditar no mês que vem, com novo projeto gráfico, as obras do autor, a começar por clássicos dele como "O Amor nos Tempos do Cólera" e "Ninguém Escreve ao Coronel".

Gabo, ele mesmo, não deverá mais escrever. Assim anunciou seu irmão Jaime em março passado, quando o "super-herói colombiano" completou seus 85 anos.


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