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Com mistura de gerações, Cacá Machado lança "Eslavosamba", seu primeiro disco autoral

Contradizendo a primeira parte do verso composto por Nelson Sargento em 1978, a máxima de que "o samba agoniza mas não morre", o gênero bebe em diferentes fontes, renova-se constantemente e dá provas de estar longe de respirar por aparelhos.

Crítica: Estreia de Cacá Machado leva toque conceitual ao imaginário do samba

A alquimia da vez é apresentada agora pelo compositor e violonista paulistano Cacá Machado, 40.

Depois de longa vida no meio acadêmico, de trabalhar em instituições como Funarte e Auditório Ibirapuera, de compor trilhas para teatro e televisão, de escrever a biografia de Ernesto Nazareth e de viver Noel Rosa em um curta-metragem, ele lança na próxima segunda-feira seu primeiro disco autoral.

Victor Moriyama/Folhapress
Cacá Machado na casa do arquiteto Guilherme Wisnik, um dos seus parceiros no disco
Cacá Machado na casa do arquiteto Guilherme Wisnik, um dos seus parceiros no disco

Com extenso trabalho de pesquisa, Machado foi buscar na Europa Oriental a base conceitual para subverter o gênero musical brasileiro mais conhecido fora do país. O resultado ele decidiu batizar de "Eslavosamba".

A brincadeira foi inspirada nos afro-sambas de Vinicius de Moraes e Baden Powell. A diferença é que o compositor paulistano reconhecia suas origens, "uma classe média intelectualizada", e se viu envolto por vários parceiros de origem eslava.

Na mesma geração de Machado estavam o poeta russo Vadim Nikitin e o arquiteto de origem polonesa Guilherme Wisnik, curador da próxima Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo.

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No disco, cada um deles assina duas parcerias com o violonista e cantor.

Cacá Machado fechou o núcleo europeu do álbum com parcerias com o artista plástico e compositor Eduardo Climachauska, de origem lituana, com o diretor artístico da Osesp, Arthur Nestrovski, de família russa, e com os "polacos" André Stolarski e Zé Miguel Wisnik.

SAMBA BRANCO

"Gosto da ideia de que todos somos 'escravos do samba', resgatando a origem etimológica da palavra eslavo, que é escravo. Também gosto de pensar que os eslavos estão associados à periferia da Europa 'civilizada', assim como o Brasil", diz Machado.

"É um samba branco, mas não confundir com samba de branco, no sentido pejorativo, sem suingue, aquele samba de elite. Não queria fazer um disco que eu chamo de 'MPB mão mole'. 'Eslavosamba' não é samba de raiz. Quem gosta de raiz é mandioca", completa o compositor.

Na tentativa de evitar que seu disco de samba ficasse hermético, sofisticado e com cara de sala de concerto --e corria esse risco pelas parcerias com nomes como Zé Miguel Wisnik, Nestrovski e Celso Sim--, Machado foi atrás de músicos que injetassem uma dose de "rua" nas 13 faixas de "Eslavosamba".

Sendo assim, convocou expoentes da música contemporânea paulistana como Kiko Dinucci, Romulo Fróes, Rodrigo Campos, Meno Del Picchia e o baterista e produtor Guilherme Kastrup.
"Eu tinha medo, com essa trajetória de vida que eu tenho, de fazer um disco tradicionalista. Essa turma trouxe uma energia contemporânea", diz o autor do álbum.

Editoria de Arte/Folhapress

ABRAÇO DE GERAÇÕES

O frescor de "Eslavosamba" não foi encontrado apenas pelo jeito moderno de Dinucci, Fróes e Campos pensarem e fazerem música.

Aflorou também no canto de Juçara Marçal (que divide a desconstruída "Valsa Lunar" com Arrigo Barnabé) e de Marcia Castro (que interpreta um dos destaques do disco, "Divino Flerte"), duas das mais belas vozes da atualidade.

Mais do que isso, Machado buscou um equilíbrio para o disco por meio de um abraço de diferentes gerações.

Neste sentido, os mais novos encontraram-se com nomes como Elza Soares, Ná Ozzetti e os instrumentistas Swami Jr. e Zeca Assumpção, entre outros.


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