Folha de S. Paulo


Biblioteca Brasiliana terá de aprender a ser pública

Além das vedações dos direitos autorais à divulgação de conteúdo na internet e das catracas defendidas pela segurança, a nova biblioteca poderá enfrentar uma terceira limitação: a econômica.

Coleção doada por José Mindlin à USP em 2006 é transferida ao prédio definitivo

Enquanto pertenceu aos Mindlin, o que definia o volume de aquisição de novas obras era o orçamento familiar. Com a doação a uma universidade pública, as regras passam a ser as das licitações.

Para Sueli Mara Ferreira, diretora técnica do Sistema Integrado de Bibliotecas da USP (SIBi), as leis podem dificultar compras, na medida em que estabelecem a prevalência do menor preço.

Já o diretor do novo espaço, Pedro Puntoni, relembra o desejo dos doadores de que "fosse uma biblioteca em expansão, coleção viva, de difusão da cultura brasileira".

COMPANHIA

Se a ampliação do acervo ainda é tema incerto, a coleção deverá ganhar companhia ao longo de 2013. Está prevista a conclusão da parcela do edifício destinada a receber o IEB (Instituto de Estudos Brasileiros), o departamento técnico do SIBi e obras raras que unidades da USP decidam acomodar ali.

"O projeto tenta reunir aqui condições que não existem em outros acervos. Nem todas as unidades preocuparam-se em proporcionar tais condições", diz Puntoni.

Ele, que é também conselheiro do SIBi, diz que o órgão pode dar apenas recomendações às bibliotecas. "Estamos tentando criar uma política centralizada para obras raras, com recomendações claras para as unidades. Se não as puderem observar, vamos pedir que as depositem aqui, mas sem poder exigir."

A começar do valor total gasto até aqui no projeto --cerca de R$ 130 milhões desde 2006--, a nova biblioteca destoa, se comparada às demais.

Editoria de Arte/Folhapress

Puntoni menciona "uma dotação orçamentaria generosa para manutenção predial". Segundo ele, esse custo ainda não foi estimado. "Estamos juntando dados para orçar um pacote de sustentação num patamar a que a USP ainda não está acostumada."

Outro diferencial que salta aos olhos é o mobiliário de designers conhecidos, como Sergio Rodrigues, Carlos Motta e Oswaldo Bratke.

Segundo o diretor, uma doação de R$ 17 milhões do BNDES garantiu móveis, automação, sistemas de segurança, controle de acesso, infraestruturas de informática e de preservação do acervo.

LIVROS EXPOSTOS

A inauguração da biblioteca será acompanhada, segundo Puntoni, da abertura de duas exposições.

Uma delas, permanente, sobre a vida do casal Mindlin, a formação do acervo, a construção do prédio e a história da imprensa. "O básico para que se reconheça o valor de um livro físico, para sensibilizar as pessoas a respeito do significado da coleção", diz.

A outra exibirá por três meses 95 títulos, entre os quais primeiras edições de Machado de Assis, Castro Alves e José de Alencar.

A ideia é valorizar também a forma dos livros, não apenas seu conteúdo. "Os exemplares destacam-se pela encadernação. Esse era um cuidado do José e também do Rubens Borba de Moraes [bibliófilo que destinara sua coleção ao amigo Mindlin]."

Para o diretor, a união de conteúdo e forma faz com que o valor da biblioteca seja "inestimável". "Nem o José sabia dizer quanto valia. O conjunto, como ele gostava de dizer, tem uma dimensão que o torna indivisível."

"A biblioteca tem um valor de preservação que as pessoas agora vão poder ver mais facilmente. Temos muitas coleções excepcionais em mau estado, como a da Biblioteca Nacional", compara.

Dentro do mais novo prédio da USP, a temperatura era agradável numa tarde de verão. Havia sistema de combate a incêndios -censores e sprinklers- e o acesso aos livros era restrito, pela leitura da impressão digital, a pessoas autorizadas.

Mas a calma era abalada pelo ruído excessivo do ar-condicionado. "É barulhento, não é? Faz oito meses que estamos brigando com as empresas da licitação que, só agora, contrataram uma outra para arrumar". Os percalços do sistema público, destaca Puntoni. (TRAJANO PONTES)


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