Folha de S. Paulo


Walt Disney é racista e megalômano em nova ópera de Philip Glass

"Sou um filho eleito, um gênio. (...) No Brasil, sou mais famoso que o Papai Noel", diz o protagonista da ópera "The Perfect American", do compositor americano Philip Glass, que estreou em Madri na semana passada. É uma das frequentes demonstrações de megalomania do personagem.

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Walt Disney refletia o pensamento de sua terra, diz Philip Glass

A peça apresenta um lado negativo de Walt Disney (1901-1966), bem diverso da alegria infantil de personagens criados por ele, como Mickey Mouse. O centro da narrativa são seus últimos meses de vida. O cenário principal da montagem de Phelim McDermott, diretor de cena, é um quarto de hospital. Walt, prestes a morrer de câncer, relembra o passado.

As memórias se confundem com fatos surreais. O protagonista trava um diálogo com um boneco de Abraham Lincoln (1809-1865), em que despreza o ativismo contra a discriminação racial. "Você foi um grande defensor da raça negra. É uma grande diferença entre nós."

Divulgação
Christopher Purves como Walt Disney) na ópera
Christopher Purves como Walt Disney na ópera "The Perfect American"

Disney pede que a família o congele depois de sua morte, para que dali a alguns séculos, com o avanço da medicina, ele possa ressurgir como um novo Messias.

As fragilidades e os traços de personalidade de Walt destacados na peça estão presentes em biografias reais. Mas é preciso marcar a diferença entre o homem que fundou a Disney e o protagonista de "The Perfect American".

Como avisa o próprio Glass, a peça não é um documentário. Baseia-se numa polêmica biografia romanceada homônima, repleta de fatos fantasiados pelo escritor Peter Stephan Jungk --que, aliás, pinta um retrato ainda mais nefasto de Disney.

O próprio antagonista da história, Dantine, não existiu. Ele é um cartunista amargurado, que acusa Walt de se apropriar das criações alheias e se ressente de ter sido demitido.

É um contraponto ao protagonista. Walt, como sugere o título da ópera, é um estandarte do sonho americano, um "self-made man". "Eu o demiti porque suas observações esquerdistas e antipatriotas insultam tudo o que a Disney representa", lhe diz Walt.

RITMO PECULIAR

As transições bruscas na peça estão refletidas na partitura. "A maior peculiaridade desta composição de Philip [Glass] em comparação com outras está no ritmo. Há muito contraste", diz Dennis Russell Davies, maestro mais frequente das obras de Glass.


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