Folha de S. Paulo


"Meus personagens são eu", diz Joaquin Phoenix

Joaquin Phoenix não é alguém que se imaginaria que se sentisse animado pela manhã. São 9h na Califórnia, a linha está ruim e o telefone do ator apresenta um defeito. Mesmo assim, este é um homem feliz, até em êxtase.

"O Mestre", novo filme do diretor de "Sangue Negro", estuda origem de culto nos moldes da cientologia
Crítica: Fotografia e batalha de atuações são pontos altos de "O Mestre"
Livro usa diretor oscarizado para revelar segredos da cientologia

"Pelo som, parece que você está no mar", digo eu, entre ruídos diversos. "Que legal! Ainda bem que não sou só eu!'' A impressão é a de que ele está realmente nas nuvens. Seria menos surpreendente se ele simplesmente grunhisse qualquer coisa.

Para um entrevistador, Joaquin Phoenix, indicado ao Oscar de melhor ator este ano por "O Mestre", é imprevisível. Será que ele vai resmungar? Vai contar piadas? Vai ser o Joaquin Phoenix de "I'm Still Here", o pseudodocumentário que supostamente o mostrou desistindo de ser ator em favor de uma carreira no hip-hop?

Ou será o sujeito que fumou em silêncio durante toda a entrevista coletiva realizada sobre o filme "O Mestre" no Festival de Veneza, para depois participar de discussões acirradas e não comparecer à entrega dos prêmios?

Phoenix --ao telefone, pelo menos-- soa despreocupado. Não me parece que seja representação. Mas as melhores representações nunca parecem que o são.

*

"Guardian" - "O Mestre" foi muito aclamado, mas também deixou as pessoas um pouco perplexas. Por que, em sua opinião, as pessoas estão tão ansiosas por respostas?
Joaquin Phoenix- Você está falando a sério?

Sim.
Sei lá! Vou dizer alguma coisa que provavelmente vai ofender alguém.

Até que ponto há algo de você em Freddie Quell, seu personagem em "O Mestre"?
Não sei. É difícil. Mas é claro que há elementos meus em cada personagem que faço. Acho que os personagens são simplesmente eu, realmente. Sinto muito. Sinceramente, não reflito tanto assim sobre as coisas.

Sobre o que você pensa?
Hahahahaha! Não, não, não, não. Quem se importa com isso?

Eu me importo.
Muita gentileza de sua parte. Vamos tomar um chá algum dia e então poderemos conversar sobre isso.

Você se sente como "Mestre", alguma vez?
Não. Acho que às vezes me sinto como Papai Noel no shopping, quando as crianças querem tirar uma foto com ele.

Crianças tentam fotografar você?
Não, estou pensando na outra noite. Fui assistir a uma banda, e um sujeito me abordou dizendo "Posso fazer uma foto? Sou um fã de verdade". E eu falei: "Olha, cara, acabei de chegar. Não leve a mal, não quero simplesmente chegar aqui e fazer uma foto --eu ficaria sem jeito". E ele simplesmente me deu as costas e foi embora, furioso.

Não pareceu que eu era alguém que ele venerava --era mais como se eu fosse uma rã de três cabeças que ele queria fotografar.

Há uma fala no filme: "Você se desviou do caminho correto". Existe um caminho correto?
Acho que "caminho correto" é subjetivo. Não acredito realmente em verdades absolutas.

Não existe um só caminho correto. Mas, se existir e você descobrir qual é, me avise.

Ok. Há alguma coisa que você queira dizer?
Não há nada de especial que eu queira dizer, e, quando tenho, geralmente resolvo o problema telefonando para um de meus amigos.

Sinto muito, sou tapado demais para ter algum tipo de discussão filosófica. Deveríamos discutir molho Tabasco ou alguma coisa assim.


Endereço da página:

Links no texto: