Folha de S. Paulo


Disney lançará brinquedo tecnológico que interage com crianças

Emily Berl - 1º.jun.2015/The New York Times
A garota Evangeline Lindes, 8, testa o novo Playmation, da Disney
A garota Evangeline Lindes, 8, testa o novo Playmation, da Disney

Por mais de dois anos, em um laboratório da Disney, alunos testaram em segredo uma versão para uso caseiro da armadura de alta tecnologia do Homem de Ferro.

O objetivo da Disney era usar sistemas sem fio, sensores de movimento e tecnologia possível de vestir para encontrar um equilíbrio entre aquilo que as crianças querem fazer (jogar videogames) e o que seus pais prefeririam (que elas se movimentem bastante).

A Walt Disney Company revelou na terça-feira (2) a linha de brinquedos resultante, chamada Playmation, que chegará às lojas em outubro nos EUA. Por cerca de US$ 120 (R$ 373), o kit para iniciantes da série "Os Vingadores" incluirá uma "luva de repulsão" do Homem de Ferro, que o jogador usa em sua mão e antebraço, e quatro brinquedos inteligentes.

Juntos, os componentes permitem que jogadores participem de missões de destruição de vilões e, nesse meio tempo, corram, se agachem, se esquivem, saltem, atirem. Um app oferece acesso a missões adicionais e a superpoderes. "É um jeito de brincar fisicamente criado para a geração digital", afirmou Thomas Staggs, vice-presidente de operações da Disney, por e-mail.

Os analistas que tiveram a oportunidade de estudar de perto a linha Playmation disseram que ela pode resolver um enigma que há muito preocupa os fabricantes tradicionais: e se os brinquedos pudessem interagir com as crianças? A resposta pode garantir a relevância de empresas como a Hasbro e a Mattel —e a Disney— junto a futuras gerações de crianças.

"Considero que esse item seja um verdadeiro avanço, especialmente no segmento de ação e 'role-playing'", disse Jim Silver, editor do TTPM, um site de crítica de brinquedos. "O que a Disney fez aqui é tão sofisticado que eu nem gosto de usar a palavra 'brinquedo' para descrever o produto".

Mas o terreno pode ser complicado. Os esforços para criar brinquedos inteligentes tendem a atrair reação rápida e severa das organizações de proteção à criança, e a privacidade é uma das preocupações. Um exemplo recente é a Barbie com conexão à internet criada pela Mattel, que grava a fala de uma criança, a analisa e oferece respostas pertinentes.

A Campaign for a Commercial-Free Childhood, uma organização ativista de Boston, não demorou a apelidar o brinquedo de "Barbie espiã" e começou a organizar pais em ação contra a fabricante. A Mattel, cujo lucro caiu em 45% no ano passado, em parte por conta da perda de interesse das crianças nos produtos Barbie tradicionais, defendeu a boneca digital, afirmando que o produto oferece salvaguardas substanciais à privacidade digital.

Preocupada com essa possível percalço, a Disney "teimou em projetar o Playmation tendo a privacidade como grande preocupação", disse Kareem Daniel, vice-presidente de estratégia e desenvolvimento de negócios da Disney Consumer Products. Os componentes do Playmation, por exemplo, são intencionalmente produzidos para não permitir conexão com a Internet quando as crianças estão brincando, disse.

Emily Berl - 1º.jun.2015/The New York Times
O vilão
O vilão "Iron Skull", boneco do Playmation

A Disney está preparando o lançamento do Playmation em ritmo acelerado. Conjuntos com o tema "Guerra nas Estrelas" serão lançados no ano que vem; os protótipos demonstrados na semana passada incluíam treinamento jedi e trapaças de Darth Vader. Uma versão "Frozen" está no calendário para 2017. Dirigidos a crianças dos seis aos 12 anos, os produtos também podem ser usados por adultos.

Com uma ampla disponibilidade de personagens no acervo da Disney e uma plataforma flexível de tecnologia para explorar, "o potencial do Playmation é imenso", disse Staggs.

Os brinquedos da linha básica do Playmation revelam uma mudança sutil mais importante na Disney Consumer Products, que vem registrando forte expansão recentemente (a divisão gerou US$ 1,4 bilhão em lucro operacional no ano passado, 22% a mais do que em 2013). A Disney tradicionalmente não criava seus próprios brinquedos, e em lugar disso licenciava personagens para uso de empresas como a Hasbro e a Mattel.

Mas o Playmation foi criado dentro da companhia, refletindo o esforço da Disney para se envolver mais na criação de novas categorias de brinquedos e gerar mais crescimento. Em caso de sucesso, isso significa também que a Disney excluirá concorrentes; personagens que não sejam controlados pela companhia não serão autorizados naquilo que ela define como "um ecossistema de brinquedos".

Há alguns concorrentes para o Playmation. Para começar, a linha está surgindo durante um a mudança de comando na Disney Consumer Products. Bob Chapek, o executivo que mais defendia o Playmation, foi promovido em fevereiro e vai comandar os parques temáticos da companhia. Sua sucessora, Leslie Ferraro, adotou o Playmation, mas sua experiência anterior está inteiramente no ramo de marketing.

Além disso, apenas duas pessoas podem ter a experiência Playmation plena ao mesmo tempo, pelo menos inicialmente, e isso pode frustrar as crianças.

Dependendo de como o Playmation seja comercializado, a linha de brinquedos também poderá colidir com o Disney Infinity, um conjunto de videogame e brinquedos vendido por uma divisão separada da companhia. Para jogar Infinity, os participantes usam bonecos de personagens que se parecem com as figuras de ação do Playmation. O Infinity 3.0, cujo foco será "Guerra nas Estrelas", e ao preço mais baixo de US$ 65 para o kit inicial, também estará nas lojas no final do ano. A Disney, porém, diz que não considera que os produtos prejudicarão um ao outro.

Ainda assim, os analistas de brinquedos se declararam encorajados pela profundidade do Playmation. O conjunto de "Os Vingadores" vem com 25 missões. A Disney também venderá brinquedos Playmation adicionais —mãos de Hulk, diversas figuras de ação— a preços de cerca de US$ 15 (R$ 46) por unidade.

"Não creio que esses brinquedos serão algo com que as crianças brinquem uma vez e depois esqueçam", disse Silver.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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