Folha de S. Paulo


Banido, Del Nero é último a cair entre atingidos por investigações da Fifa

A Fifa demorou mais de dois anos, mas, nesta sexta-feira (15), aplicou a primeira punição ao presidente da CBF, Marco Polo Del Nero.

O Comitê de Ética da entidade máxima do futebol anunciou o banimento provisório do cartola de todas as atividades esportivas por 90 dias. A punição pode aumentar em até mais 45 dias se o órgão achar necessário.

Ele é acusado na Justiça dos EUA de participar de um esquema de recebimento de propina na venda de direitos de TV de campeonatos de futebol na América do Sul junto com outros cartolas.

Entre todos os dirigentes sul-americanos envolvidos no escândalo, o ex-presidente da FPF (Federação Paulista de Futebol) foi o último a perder o cargo que ocupava. Cartolas da Conmebol e das confederações da Venezuela, Equador, Chile, Colômbia e Bolívia indiciados pelas autoridades dos EUA como o brasileiro já tinham deixado seus cargos (veja abaixo).

editoria de arte/Folhapress

Desde o dia 23 de novembro de 2015, a Câmara de Investigação do Comitê de Ética da Fifa apura infrações cometidas por Del Nero.

A decisão desta sexta foi interpretada por aliados do presidente da CBF como uma resposta da Fifa as autoridades dos EUA. José Maria Marin, seu antecessor na CBF, é julgadoem Nova York por extorsão, fraude financeira e lavagem de dinheiro.

Del Nero é acusado pelos promotores norte-americanos dos mesmos crimes.

Apesar de a punição não ser definitiva, aliados do dirigente acham ser difícil a Fifa recuar e absolver o cartola.

Del Nero Banido

A decisão pelo banimento provisório foi tomada pelo grego Vassilios Skouris, presidente da Câmara de Julgamentos do Comitê de Ética da Fifa, seguindo recomendação da colombiana Maria Claudia Rojas, presidente da Câmara de Investigação do mesmo órgão. Ambos foram indicados para os cargos que ocupam desde maio deste ano pelo atual presidente da Fifa, o suíço Gianni Infantino.

Segundo o código de ética da Fifa, a punição provisória aplicada a Del Nero pode ser dada quando há indícios de violação do código de ética e "uma decisão definitiva sobre o caso pode não ser tomada suficientemente cedo" ou para prevenir que a pessoa acusada interfira em investigação em andamento. O dirigente será convocado a fazer sua defesa perante o comitê.

Esta é a segunda vez que Del Nero se afastará da presidência da CBF desde que foi eleito, em abril de 2015. Em dezembro do mesmo ano, após ser indiciado pela Justiça dos EUA, o dirigente se licenciou do cargo.

Desde que passou a ser investigado pelo FBI, em maio de 2015, quando eclodiu o escândalo de corrupção da Fifa, o dirigente nunca mais viajou para o exterior temendo ser preso. Marin cumpre prisão domiciliar nos EUA.

Na última quinta (14), o advogado de Marin, Charles Stillman, disse que seu cliente era como um rei que fazia os discursos e participava de cerimônias, mas era Del Nero, quem tomava as decisões.

"Marco Polo era quem mandava no show no futebol brasileiro", disse Stillman. "Os discursos pertenciam a Marin, mas as decisões eram de Del Nero. Ele era visto como quem mandava na CBF."

Del Nero foi braço direito de Marin durante toda a sua gestão, que começou em março de 2012, depois de Ricardo Teixeira renunciar à presidência da entidade após mais de 20 anos no cargo. Sucessor de Marin, Del Nero tentaria a reeleição em 2018.

NEGÓCIOS SUSPEITOS
Além de ser investigado pelo FBI, o dirigente também é alvo de inquérito da Polícia Civil de São Paulo, que apura irregularidades em convênios firmados pelo dirigente com o governo do Estado de São Paulo quando ele ainda comandava a FPF (Federação Paulista de Futebol).

Em fevereiro de 2015, Del Nero comprou cobertura dúplex por R$ 5,2 milhões de uma empresa dos filhos do empresário Wagner Abrahão, acusado de fazer ponte para Marin receber propina.

No negócio, considerado atípico e revelado pela Folha, Del Nero pagou R$ 4,8 milhões e repassou à empresa dos filhos de Abrahão um imóvel no mesmo condomínio por R$ 400 mil mais um saldo devedor não revelado.

Na época, o cartola negou irregularidade na transação.

OUTRO LADO
Em nota, Del Nero negou ter recebido propina e destacou que todos os contratos considerados suspeitos pela Justiça americana foram assinados antes de 2015, quando ele assumiu a CBF.

"A tentativa de réus e delatores se livrarem de acusações que lhe são dirigidas através do expediente corriqueiro de atribuir a terceiros inocentes a prática da infração em troca de benesses processuais é comum nos tribunais e não pode ser aceita como verdade absoluta", afirmou o dirigente, em referências as acusações feitas por delatores e pelos advogados de José Maria Marin.

Del Nero afirma ainda que seus advogados "requererão, no momento processualmente adequado, o arquivamento dessas graciosas especulações investigativas e a adoção das contramedidas cabíveis".

Por fim, o agora presidente afastado da CBF lança um desafio aos seus acusadores: "Antes de acusarem a quem nada deve, apresentem provas e documentos que indiquem as contas bancárias, as remessas, o meu envolvimento -direto ou indireto- com empresas investigadas, o recebimento ou o 'caminho do dinheiro'", conclui.

Também em nota, a CBF informou que recebeu a notificação da Fifa e que Antônio Carlos Nunes, 79, o coronel Nunes, comandará a entidade. Ex-presidente da Federação Paraense de Futebol, Nunes é o vice-presidente mais velho da CBF e o primeiro na linha sucessória.

Durante evento na sede da confederação na tarde desta sexta, dirigentes da entidade preferiram o silêncio. O coordenador de futebol feminino da CBF, Marco Aurélio Cunha, foi o único que defendeu a gestão de Del Nero.

"A CBF é uma instituição com vida própria, funcionários exemplares, uma direção moderna, com o que há de melhor em termos de gestão profissional", disse Cunha.


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