Folha de S. Paulo


Tragédia da Chapecoense completa um ano sem conclusão sobre culpados

Um ano após a tragédia aérea que matou 71 pessoas entre jogadores, técnicos, jornalistas e convidados nas cercanias de Medellín, autoridades não divulgaram pareceres conclusivos sobre a queda.

Apurações conduzidas por órgãos colombianos e bolivianos produziram relatórios preliminares, mas ainda não cumpriram a promessa de entregar um laudo definitivo.

O Griaa (Grupo de Investigação de Acidentes Aéreos da Autoridade Aeronáutica), da Colômbia, enviou oito agentes ao município de La Unión no mesmo dia do desastre.

O grupo confeccionou documento que foi consolidado no dia 22 de dezembro, de forma preliminar. O relatório apontou que o fato de não ter havido explosão reforçava a tese de falta de combustível.

Isso porque as 8,85 toneladas de combustível para o voo não reservavam margem para uma emergência.

Além disso, a apuração sugeriu a hipótese de sobrepeso do avião. O mínimo estimado na decolagem era de 42,1 toneladas, acima do máximo permitido de 41,8.

Os colombianos também visitaram a Direção Geral de Aeronáutica GAC da Bolívia, e houve colaboração. Porém, a Aasana (Administração de Aeroportos e Serviços Auxiliares à Navegação Aérea) não providenciou nenhuma das informações solicitadas.

No relatório, investigadores colombianos prometeram publicar parecer definitivo, o que não ocorreu. À Folha, o Griaa afirmou que trabalha na revisão do documento.

"Atualmente, o informe final do acidente se encontra passando pelas devidas revisões internas e internacionais de acordo com os protocolos da Organização Internacional da Aviação Civil", disse.

A Chapecoense pagou US$ 130 mil para fretar o voo da boliviana LaMia. Cabia à empresa levar a delegação rumo à Colômbia desde o Brasil –de Cumbica a Medellín, cumprindo eventuais escalas.

Entretanto, a LaMia estava proibida pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) de operar nos aeroportos do Brasil, devido a irregularidades.

Além disso, a apólice de seguro da empresa estava suspensa por falta de pagamento. Pelo documento do seguro, a LaMia só poderia voar para Peru, países da África, Síria, Afeganistão e Iêmen.

A delegação tomou um voo da empresa boliviana BOA até Santa Cruz de la Sierra e só então embarcou em aeronave da LaMia até Medellín.

De acordo com as leis bolivianas, seguradora e companhias aéreas têm obrigação de avisar as autoridades que a apólice estava em atraso.

A agência nacional de aviação local também é responsável por checar a validade de seguros e evitar que companhias sem apólice operem.

Segundo o jornal boliviano "El Deber", investigação do Ministério Público da Bolívia arrolou cinco pessoas como culpadas, mas a apuração ainda não foi encerrada.

São elas Gustavo Vargas Gamboa, ex-gerente da LaMia, Joons Teodovich, ex-funcionário da Aasana, e o filho de Vargas, Gustavo Villegas, que chefiou o Registros de Licenças da DGAC (Direção Geral de Aeronáutica Civil).

Outros dois implicados são Marco Antonio Rocha, co-proprietário da LaMia, e Celia Castedo, a funcionária da Aasana que reviu o plano de voo da aeronave entre Santa Cruz de la Sierra e Medellín.

Celia está refugiada no Brasil desde o final do ano passado. Ela vive atualmente em Corumbá e foi declarada foragida pela Justiça boliviana. Para voltar, quer garantias em relação a sua segurança.

Procurada pela Folha, a Aasana disse que a responsabilidade é da DGAC, que não respondeu às perguntas.

NO BRASIL

O MPF (Ministério Público Federal) concluiu em outubro deste ano um inquérito civil no qual afirmou que a Chapecoense não foi negligente ao contratar a LaMia.

A Procuradoria conduziu investigações a partir de dezembro de 2016, após reuniões com os Ministérios Públicos de Bolívia e Colômbia.

Entretanto, o MPF apontou a possibilidade de irregularidades em autorizações expedidas pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).

Duas semanas antes do acidente com a Chapecoense, a seleção da argentina voou para o Brasil na mesma aeronave da LaMia. O destino foi Belo Horizonte, onde a Argentina enfrentou o Brasil pelas eliminatórias da Copa.

A investigação dos procuradores brasileiros também obteve elementos que mostram possíveis fragilidades no sistema de autorização de voos fretados pela agência.

Segundo a Procuradoria, em outubro foram expedidos ofícios à Anac, ao Tribunal de Contas da União e à Secretaria Nacional de Avião Civil, que deveriam adotar medidas cabíveis em suas atribuições.

APELO À JUSTIÇA

Viúvas de seis jogadores –Gil, Ananias, Gimenez, Bruno Rangel, Canela e Lucas Gomes– foram à Justiça exigindo da Chapecoense a integração dos direitos de imagem aos danos morais e pagamento de pensão.

O clube diz que não pode ser responsabilizado pelo acidente. "A Chapecoense me deu meu marido em um caixão se desfazendo. Ele saiu de casa vivo e voltou morto", disse Valdécia Borges de Morais Paiva, viúva de Gil.

O clube pagou as rescisões trabalhistas às famílias. Além disso, receberam seguros que a Chapecoense e a CBF tinham.

Hoje, existem duas associações de vítimas. Uma delas recebe R$ 28,8 mil por mês do clube.

Em março, a Chapecoense repassou R$ 40,2 mil (líquidos) para cada uma das famílias dos mortos, arrecadados em doações e no amistoso da seleção.


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