Folha de S. Paulo


'Maior clube de bairro do mundo', Lanús coleciona taças no século

Rival do Grêmio na final da Copa Libertadores, a partir desta quarta-feira (22), o Club Atlético Lanús vive desde 2007 os mais gloriosos dos seus 102 anos de existência.

Neste período, ganhou títulos de expressão. Levou por duas vezes o Campeonato Argentino e uma vez a Copa Sul-Americana, quando superou a Ponte Preta na decisão.

A ascensão do Lanús no futebol argentino e continental faz seus torcedores e dirigentes se orgulharem cada vez mais da alcunha de "maior clube de bairro do mundo".

O futebol, e os outros esportes, como o basquete, explicam muito da relação entre a torcida "granate" –alusão à cor grená de seu uniforme– e a região, localizada na grande Buenos Aires, a 15 km do centro da capital federal. Mas há outros fatores importantes de aproximação.

Dentro do clube, sob as arquibancadas do estádio "La Fortaleza", existe uma escola infantil, fundamental e secundária que atende o bairro. Há planos da criação de uma universidade em breve.

O ensino, conforme consta no site oficial da instituição, está baseado nas ideias educacionais do brasileiro Paulo Freire (1921-1997). Pensador adepto da tese de que o educando deveria construir sua educação, escolher os seus próprios caminhos e não participar de um sistema onde tudo já está definido.

A paixão pelo time é tão grande que o aniversário dos 100 anos, em 2015, fez com que mais de 5.000 torcedores saíssem por Lanús em passeata. Parte destes torcedores, de forma voluntária, trabalharam na modernização do estádio nos anos 1990. A estrutura de madeira, que estava caindo, passou a ser de concreto, mais segura.

Hoje, em todo o distrito de Lanús –onde existe um bairro e cidade de mesmo nomes– são cerca de 450 mil habitantes, 40 mil deles sócios ativos do clube. Uma quantidade inferior à capacidade do estádio La Fortaleza, onde será a segunda partida da final na quarta (29). O local comporta 47.027 torcedores.

"Não nos interessa apenas o que acontece na parte esportiva. Damos aos mais pobres a oportunidade de usarem nossas instalações, seja para um banho ou para um almoço", disse à Folha o presidente Nicolás Russo.
A proximidade com a população e a identificação dos atletas com o clube são apontados pelo cartola como o segredo do sucesso da equipe, que não faz loucuras para montar elencos.

A folha salarial dos jogadores e membros da comissão técnica ronda na casa dos 70 milhões de pesos mensais (R$ 1,3 milhão). O valor é menos da metade do investido pelos gigantes do país, como o Boca Juniors e o River Plate, vítima do Lanús na semifinal.

"Este sucesso não é de hoje. É algo que estamos trabalhando há muitos anos. Aqui não há egos ou brigas políticas. Todos remamos para o mesmo lado", disse Russo.

"Há também um trabalho muito bem feito nas divisões de base. E isso se reflete nos resultados", completou.

Nos últimos anos, além de criar e vender jogadores de bom nível técnico –existem alguns nos Estados Unidos, México e Europa–, o clube tem buscado jogadores mais baratos, no vizinho Paraguai. O que tem dado certo.

A tradição de revelar jogadores do Lanús esteve presente até na seleção da Argentina campeã do mundo de 1986. O meio-campista Héctor Enrique, apesar de ter feito história também no River Plate, é cria do clube grená. O jogador foi um dos destaques da festa do centenário.

Juan Mabromata - 31.out.2017/AFP
Atacante José Sand é o destaque do Lanús na Libertadores
Atacante José Sand é o destaque do Lanús na Libertadores

GLOBETROTTERS
A chegada à decisão da Libertadores veio na sexta vez que o clube disputou o torneio. Estreou em 2008 e tinha como melhor resultado até agora as quartas de final na edição de 2014.

Em torneios de elite, tem mais conquistas que o próprio Grêmio neste século.

Um feito e tanto para quem em toda a história só tinha um troféu relevante em sua galeria, o da Copa Conmebol de 1996, quando bateu o Independiente Santa Fé (COL).

Sempre vivendo à margem do grupo de cinco grandes do futebol argentino– que conta, além de Boca e River, com San Lorenzo, Independiente e Racing– o Lanús nem sempre surfou na crista da onda, ainda que na década de 1950 tenha ficado conhecido como "Globetrotters" pelo futebol ofensivo e vistoso.

Há 40 anos, o clube foi rebaixado para a terceira divisão nacional (Primera C) e esteve bem perto de ir à falência, com dívidas de dois milhões de dólares e mais de 200 processos na Justiça. Foi então que os 2 mil sócios resolveram se unir e iniciar o processo de reestruturação.

Ano a ano a partir de 1978 conseguiu melhorar a sua situação e reverter o quadro. Entre idas e vindas para a segunda divisão, conseguiu se firmar na primeira na temporada de 1992/1993 e desde então jamais foi rebaixado.


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