Folha de S. Paulo


Era Del Nero quem mandava na CBF, diz defesa de Marin nos EUA

Vanessa Carvalho/Brazil Photo Press/Folhapress
Ex-presidente da CBF José Maria Marin deixa tribunal no Brooklyn, em Nova York

"Há uma diferença crucial entre estar em campo e jogar o jogo." Charles Stillman, advogado de José Maria Marin, o ex-presidente da CBF que está sendo julgado em Nova York no escândalo de corrupção da Fifa, diminuiu o papel de seu cliente em negociações no órgão que comanda o futebol no mundo todo.

Em sua primeira aparição diante do júri, Stillman disse na corte do Brooklyn que Marin atuou como jogador no banco de reserva. Ele estava lá, mas não assumiu as responsabilidades típicas de um presidente da CBF, entre elas a de ocupar um assento no Comitê Executivo da Fifa.

A estratégia é jogar a responsabilidade pelos supostos crimes na conta do atual presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, então vice de Marin e indiciado pelas autoridades dos Estados Unidos.

Segundo a defesa de Marin, era Del Nero quem representava o Brasil na direção do órgão internacional. Era ele a "grande figura" do futebol brasileiro, segundo o advogado do cartola em prisão domiciliar.

Nas palavras de Stillman, Marin foi um "substituto temporário", alguém para "ocupar o lugar", da mesma forma que crianças numa pelada chamam as outras para ajudar a completar um time.

Essa distinção é importante porque o que está sendo julgado nos EUA é o suposto recebimento de propina por parte dos dirigentes associados à Fifa, por isso a estratégia da defesa de Marin de relegar a segundo plano sua
atuação no órgão.

José Roberto Batochio e Jorge Nemr, os advogados de Marco Polo Del Nero, também investigado pela Justiça americana, não quiseram comentar a estratégia de defesa usada por Stillman "por imperativo ético".

Marin, o peruano Manuel Burga e o paraguaio Juan Ángel Napout são os únicos três réus entre cerca de 40 indiciados pela Justiça americana que se declaram inocentes no escândalo de corrupção -a suspeita é que eles receberam quase R$ 500 milhões em propina ao longo das últimas duas décadas.

"Marin recebeu milhões de dólares em contas bancárias aqui em Nova York", acusou Keith Edelman, promotor americano, na primeira apresentação do caso aos jurados.

Ele acusou ainda Napout, ex-presidente da Conmebol e ex-vice-presidente da Fifa, e Burga, ex-presidente da Federação Peruana de Futebol, de participarem do esquema.

"Quando assinavam contratos, os réus recebiam propinas e fizeram de tudo para manter os pagamentos em segredo", disse Edelman. "Eles recebiam malas de dinheiro, falavam em código e usavam o nosso sistema bancário."

Muitas das testemunhas que estão sendo chamadas a depor pela Justiça americana, aliás, são réus que fecharam acordos de colaboração com autoridades do país em busca de penas menores.

Os advogados da defesa não têm a lista completa dos nomes que serão chamados, mas anteciparam alguns deles no primeiro dia do julgamento, entre eles o empresário argentino Alejandro Burzaco, que dirigia a Torneos y Competencias, o colombiano Luis Bedoya, ex-vice-presidente da Conmebol, e o venezuelano Rafael Esquivel, ex-chefe do futebol de seu país.

O advogado de Marin afirmou ao júri que esses depoimentos devem ser vistos à luz do fato de que são fruto de acordos de leniência.

"O que vocês vão ouvir são pessoas que tentaram fazer com que coisas que soassem criminosas aparecessem nas gravações", disse. "Vão ouvir versões de testemunhas que já assumiram sua culpa."


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