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Comissão vai propor que COB deixe de distribuir recursos públicos

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Rio de Janeiro, Rj, BRASIL. 13/10/2017; Entrevista com Paulo Wanderley, presidente do COB ( Foto: Ricardo Borges/Folhapress)
O novo presidente do COB, Paulo Wanderley, em entrevista na sede da entidade, no Rio de Janeiro

A comissão incumbida de propor reformas ao estatuto do COB (Comitê Olímpico do Brasil) quer tirar da entidade a distribuição das verbas públicas oriundas da Lei Piva.

A medida será recomendada por Marco Aurélio de Sá Ribeiro, presidente da CBVela (Confederação Brasileira de Vela), um dos quatro integrantes das comissão.

Os outros são Ricardo Machado (presidente da confederação de esgrima), José Antônio Fernandes (presidente da de atletismo) e Tiago Camilo (líder da comissão de atletas do comitê olímpico).

Os quatro se reunirão nesta quarta-feira (25), no Rio, para discutir adaptações ao estatuto. Porém, a mais relevante delas trata da Lei Piva.

Os recursos advindos da legislação se tornaram base da plataforma que manteve Carlos Arthur Nuzman à frente da entidade por 22 anos –ele renunciou último dia 11 de outubro face às suspeitas de envolvimento em esquema.

Ribeiro sugere que seja criado um conselho de administração independente que se encarregue de controlar as verbas públicas que passam pelo comitê, entre as quais as aportadas pela Lei Piva.

Caberia ao órgão, ainda, definir os parâmetros para repassar verbas a confederações, o que atualmente fica a cargo da área técnica do COB.

Mais do que isso, segundo o proponente a direção do comitê deveria satisfação e pedir autorização ao conselho para empregar os recursos.

Como usa dinheiro da Lei Piva para manutenção, o COB precisaria propor anualmente um orçamento e defendê-lo perante os conselheiros, que deliberariam sobre quanto seria de fato liberado.

"Minha ideia talvez desaponte algumas pessoas, mas temos que levar democracia à base e temos que dar voz aos outros atores", disse Ribeiro em entrevista à Folha.

Para 2017, o comitê trabalhou com estimativa de receber R$ 210 milhões da lei.

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QUANTO AS PRINCIPAIS ENTIDADES DO ESPORTE RECEBERAM DAS LOTERIAS Ano a ano, em milhões de reais
Quanto as entidades esportivas recebem das loterias, ano a ano, em milhões de reais

O conselho não teria dirigentes do COB nem presidentes de confederações, que continuariam a compor a assembleia geral do comitê.

Ele seria eleito e provavelmente formado por um colégio eleitoral formado por atletas, ex-atletas, técnicos e representantes de clubes. Todos teriam de cumprir certos critérios elegibilidade.

Ribeiro acredita que o Ministério do Esporte deve indicar um membro também. Ao todo, o conselho teria entre 15 e 20 componentes.

"O COB é uma entidade de gestão de esporte. Só que, devido à Lei Piva, ganhou papel de executor de política pública via repasse dos recursos. A questão é garantir a boa governança do dinheiro público que está sendo empregado. Para isso, é preciso ter ampla representação da sociedade", afirmou Ribeiro.

O dirigente ressalvou que verbas provenientes de apoiadores privados do COB não ficariam sobre escrutínio do conselho de administração.

O novo presidente do comitê olímpico, Paulo Wanderley, que sucedeu Carlos Arthur Nuzman, disse que espera que um novo estatuto seja aprovado já em novembro pela assembleia da entidade.

As adaptações são necessárias para que o COI (Comitê Olímpico Internacional) derrube a suspensão imposta no início do mês depois que Nuzman foi preso –ele foi liberado no final de semana.

DEPENDÊNCIA

Sancionada em 2001, a Lei Piva instituiu que percentual da arrecadação bruta das loterias federais seja repassada ao esporte olímpico nacional.

O COB e o CPB (Comitê Paraolímpico Brasileiro) são os intermediários. Ao COB coube administrar, nos últimos anos, 1,7% do total –equivale a mais de R$ 1 bilhão.

Além de repartir parte do montante entre confederações esportivas, esporte escolar e universitário, o COB também usa o dinheiro para despesas administrativas e para pagar salários a presidentes de confederações.

Levantamento pela Folha neste mês mostrou que 10 das 30 confederações olímpicas nacionais tiveram o exercício de 2017 totalmente custeado com verba da lei.

INSPIRAÇÃO NO ATLETISMO

A comissão de reforma do estatuto do COB pretende buscar inspiração nas amplas adaptações que a IAAF (Associação Internacional das Federações de Atletismo) para basear suas propostas de mudança.

A IAAF promoveu profundas modificações estruturais desde 2015, quando o senegalês Lamine Diack deixou o comando e foi sucedido por Sebastian Coe.

Diack é acusado pela Justiça francesa de corrupção e acobertar casos de doping quando estava à frente da IAAF (1999-2015).

Assim como seu filho Papa Massata, também está envolto no suposto esquema de compra de votos para os Jogos de 2016 e 2020, do qual Carlos Arthur Nuzman é suspeito de participar como elo.

Desde que Coe ascendeu ao poder, a IAAF criou uma divisão de integridade para desenvolver sobretudo novas políticas de combate ao doping e promoveu renovação estatutária.

Naquele mesmo 2015, a associação suspendeu a Rússia de todas as competições internacionais, o que ainda não foi revogado.

José Antônio Fernandes, presidente da Confederação Brasileira de Atletismo e membro da comissão de reformas do COB, acompanhou a reforma da IAAF e disse que as alterações de governança vão ao encontro do que o COB precisa.

O problema é o tempo, já que o COB estipulou o prazo de 45 dias."O tempo é muito curto", disse Marco Aurélio de Sá Ribeiro, outro membro da comissão do COB.


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