Folha de S. Paulo


Com dinheiro investido no clube, cartola são-paulino tenta gerir crise

Marcello Fim/Raw Image/Folhapress
O técnico Dorival Junior (E) e o diretor executivo de futebol Vinicius Pinotti (D) o durante treino do São Paulo no CT da Barra Funda, zona oeste de São Paulo nesta sexta-feira (29). O São Paulo enfrenta o Sport no próximo domingo (01/10) pela 26ª rodada do Campeonato Brasileiro no Estádio do Morumbi. Foto: Marcello Fim/Raw Image ORG XMIT: MARCELLO FIM / RAW IMAGE ***PARCEIRO FOLHAPRESS - FOTO COM CUSTO EXTRA E CRÉDITOS OBRIGATÓRIOS***
O técnico Dorival Junior (esq) e o diretor-executivo Pinotti enfrentam das piores fases do São Paulo

Quando o São Paulo apresentou o atacante argentino Ricardo Centurión, em fevereiro de 2015, havia no palco também uma figura enigmática, que se introduzia como torcedor e investidor para bancar a contratação.

Pouco mais de dois anos depois, em maio de 2017, Vinícius Pinotti, 41, dessa vez era a própria notícia, ao ser nomeado o diretor-executivo de futebol do clube.

"Sempre sonhei em estar aqui, mas não imaginava que seria tão rápido assim", disse à Folha.

Pinotti passou a ocupar o cargo justamente quando o time enfrenta uma das fases mais complicadas de sua história, envolvido, pelo segundo ano seguido, na luta contra o rebaixamento.

Chegou lá ao se projetar como novo quadro político de uma instituição desesperada por reformulação e respaldado por sua fortuna, por mais que não goste da observação.

"Foi um investimento barato", diz sobre os 4 milhões de euros (R$ 15 milhões em valores atuais) por 70% dos direitos de Centurión.

Ele é dos poucos dirigentes que seguiu no cargo após a renúncia de Aidar, em outubro de 2015, e a primeira eleição de Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco.

Na verdade, se fortaleceu com a mudança. Sua influência extravasou o departamento que ocupava na gestão anterior, no marketing. Voltou a ajudar o futebol em 2016 ao pagar o 13º dos atletas.

Diz ainda ter colaborado financeiramente com a campanha do atual presidente.

Com o segundo mandato de Leco assegurado em abril e a mudança estatutária, Pinotti foi um dos quatro executivos nomeados. Recebe salário em torno de R$ 10 mil, remuneração simbólica, até dez vezes menor que a de alguns antecessores.

As dívidas do clube com o dirigente são pagas em longas prestações, seguindo correção monetária.

Não há pressa. A família herdou do pai, Anizio, ações da Natura, da qual representa um dos blocos do grupo de controle da empresa.

Em seu antebraço direito, estampa tatuagem que diz: "Pai, meu herói".

Com seu capital, passou a atuar como investidor. Mas gosta de lembrar a origem de baixa classe média, na zona sul paulistana.

Não descarta colocar mais dinheiro mais no clube. Diz que, por ora, não é necessário.

"É algo que se fala, até por ter sido feito recentemente em um co-irmão [o Palmeiras]. Mas o São Paulo também precisa caminhar com as próprias pernas. Hoje estamos em posição superavitária."

Rubens Chiri/Reprodução/saopaulofc.net
Centurión é apresentado, recebe a camisa 20 e já projeta estreia pelo Tricolor -- http://www.saopaulofc.net/noticias/noticias/futebol/2015/2/3/me-seduziu-o-clube,-que-e-muito-grande/
Com Pinotti ao seu lado, o meia-atacante argentino Centurión chegou ao São Paulo em fevereiro de 2015

SUBINDO

A Folha falou com pessoas que tiveram contato direto com o diretor em suas diversas atribuições em meio à ascensão repentina no clube.

Existe a crença de que Pinotti seria capaz de oferecer ao futebol mais profissionalismo e reestruturação gerencial. É visto como alguém que sabe mexer com finanças.

A dedicação ao trabalho e ao clube é apontada como diferencial, antes mesmo de abrir expediente no centro de treinamento da Barra Funda.

Por outro lado, há ressalvas quanto a sua escalada.

Uma linha crítica questiona quais seus predicados para ser o diretor de futebol.

Aponta-se que não seria do ramo e não teria a experiência para lidar com o vestiário.

Pinotti diz poder oferecer "governança" ""um termo que lhe é muito caro"" e que, para questões esportivas, estaria cercado por especialistas.

Registre-se também a presença constante do presidente Leco no CT. A palavra final será dele, tal como aconteceu na demissão de Rogério Ceni.

Em termos de chegadas e partidas, batalhou persistentemente pela volta de Hernanes.

Na contramão, com habilidade, costurou a rescisão do meia Wesley, hoje no Sport, economizando R$ 5 milhões.

Seus defensores dizem que talvez o futebol precise justamente de uma visão de fora.

Lembram que, no marketing, também poderia ser considerado um "forasteiro", mas que deu resultado.

Em época de vacas magras, trouxe patrocínios. O clube não fechava um acordo de longo prazo para marcas na camisa havia dois anos. Embora os valores sejam considerados baixos para o mercado, internamente os contratos foram pontos a seu favor.

Foi ele, porém, que contratou o ex-gerente de marketing Alan Cimerman, demitido em agosto por justa causa sob acusação de práticas corruptas relacionadas a shows no Morumbi (ver ao lado).

Pinotti também tem se dedicado a incrementar o estafe em torno do time profissional. A contratação de Altamiro Bottino, ex-Palmeiras, como coordenador científico, foi um passo nessa direção.

Maurício Rummens/Fotoarena/Folhapress
Vinicius Pinotti apresenta o meia atacante Maicosuel antes do treino do São Paulo
Pinotti apresenta o meia-atacante Maicosuel no CT do São Paulo

JOGO ARRISCADO

Alguns aliados creem que o diretor possa ter se precipitado em assumir o cargo nas atuais circunstâncias.

Não só pela fase delicada do time, mas também pela instabilidade política do clube, deflagrada durante o terceiro mandato de Juvenal Juvêncio e agravada pelos escândalos envolvendo Aidar.

"Sabia dos riscos, mas isso me move", disse Pinotti.

O temor de alguns aliados é de que não esteja preparado para as pressões de um cargo de repercussão pública. Está agora exposto à opinião de milhões de torcedores e ao jogo político do clube.

Seus aliados reconhecem que pode ser impulsivo, se provocado. "Não sabe ouvir não" foi uma das frases usadas para descrevê-lo.

Profissionais ligados à campanha de Leco citam uma postura excessivamente defensiva diante de notícias contrárias.

Tendia a ver as digitais da oposição em tudo. O grupo contava com o apoio de outro milionário de papel recente no Morumbi: Abílio Diniz.

Ao menos o time vive paz momentânea com a torcida.

Em setembro, Leco articulou visita de representantes das organizadas e de outros grupos ao CT do clube.

Pinotti já esteve próximo da Independente. Admite que, na arquibancada, tendia a se posicionar ao lado da organizada. Mas nunca foi filiado.

Agora diretor, sabe que será avaliado apenas pelos resultados do time em campo.

O São Paulo luta para evitar o rebaixamento no Brasileiro. Seria um duro golpe ao seu projeto, mesmo que só tenha assumido o cargo em maio.

Nesse sentido, espera que não haja mais nenhuma coletiva tão cedo o envolvendo.

Troca de comando no futebol é algo já recorrente no São Paulo. Com Leco, desde outubro de 2015, entre diretores e vice-presidentes, Pinotti foi o oitavo dirigente nomeado.

"O clube precisa acreditar numa ideia e seguir em frente", disse o executivo.

O CASO CIMERMAN

Conselheiros de oposição do São Paulo querem ouvir explicações de Vinícius Pinotti sobre sua relação com Alan Cimerman, ex-gerente de marketing do clube. Para isso, solicitam reunião extraordinária.

Levado ao marketing do clube por Pinotti em 2015, Cimerman está no centro de um inquérito conduzido pelo Deic (Departamento Estadual de Investigações Criminais).

O motivo: suposto desvio de verbas e corrupção na venda de ingressos e locação de camarotes para os shows de U2 e Bruno Mars no Morumbi.

Quando a nova diretoria do clube tomou nota dessas supostas fraudes, o demitiu por justa causa.

É por isso que, ao tratar a vocação de gestor Pinotti para o departamento de futebol do São Paulo, os críticos não demoraram a citar o nome de Cimerman como um deslize significativo.

O caso foi descoberto durante investigação interna encomendada pelo São Paulo. Não foi encontrado nenhum documento suspeito em que constasse sua assinatura.

Pinotti, que também pode ser chamado para prestar depoimento no Deic, afirma que desconhecia essas atividades.

O esquema teria sido executado durante a troca de diretoria neste ano.

Funcionários do marketing também recordam que Cimerman havia dado resultados e conquistado respaldo de diferentes áreas do Morumbi.

"Eu me arrependo e me sinto traído. Seria injustiça vincular meu nome ao dele", disse Pinotti.

O site UOL, empresa do Grupo Folha, que edita a Folha, revelou que, por seis meses, o diretor fez pagamentos mensais de R$ 9 mil a Cimerman, quando este ainda era funcionário do clube.

A Folha apurou que os depósitos eram um complemento para honrar os valores da proposta original feita ao ex-gerente.

A "mesada" é o que desperta a curiosidade da oposição são-paulina.

Este é o primeiro episódio público enfrentado por Pinotti, num momento em que os bastidores do Morumbi voltam a borbulhar com críticas à gestão do presidente Leco.

Politicamente, o diretor-executivo segue prestigiado por maioria entre os conselheiros.


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