Folha de S. Paulo


Delator de Nuzman cobra intervenção do COI no Comitê Olímpico Brasileiro

Ricardo Borges/Folhapress
Carlos Arthur Nuzman (à esq.), presidente do COB e do comitê Rio-2016, presta depoimento na sede da Polícia Federal no Rio

Eric Maleson, 50, dirigiu a CBDG (Confederação Brasileira de Desportos no Gelo) e participou dos Jogos Olímpicos de Inverno como atleta do bobsled, mas seu papel dentro do esporte nacional ganhou um novo capítulo nesta terça-feira (5).

O carioca, que vive em Boston, tornou-se delator de um suposto esquema de compra de votos que teria eleito o Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016 e que foi exposto em operação da Polícia Federal. O presidente do COB (Comitê Olímpico do Brasil) e do Comitê Rio-2016, Carlos Arthur Nuzman, é alvo da investigação.

Maleson se propôs a depor a investigadores franceses e deu informações sobre supostas irregularidades no COB e no processo eleitoral que garantiu os Jogos de 2016 para o Rio.

Agora, ele quer que as apurações e desdobramentos continuem. O carioca, que há cinco anos deixou a CBDG e é desafeto de Nuzman, afirmou que enviou comunicados ao COI (Comitê Olímpico Internacional) pedindo que faça uma intervenção no COB.

Operação Unfair Play
Polícia Federal investiga compra de votos para escolha do Rio como sede olímpica

"Foi um dia triste para o esporte brasileiro, porém um dia de esperança. Não tenho dúvida de que o COI terá de intervir ou então solicitar uma mudança drástica dentro do COB. Eu fiz novamente esse pedido. O COI tem obrigação de intervir quando há indícios como os que foram revelados na operação da PF. Isso está no próprio estatuto do COI, afirmou Maleson à Folha.

"O COB precisa de uma intervenção e mudar toda a administração, com pessoas idôneas e que conheçam o esporte brasileiro."

O ex-dirigente da CBDG disse que enviou uma missiva em nome do alemão Thomas Bach, atual presidente do COI. Ele também ressaltou que procurou a entidade, responsável por organizar os Jogos Olímpicos e regular o Movimento Olímpico internacional, desde que o antecessor de Bach, o belga Jacques Rogge, estava no poder. Porém, nunca obteve retorno.

"Desta vez eles vão atender. Porque se não atenderem serão coniventes com o que está acontecendo. O COI pode ser acionado por negligência. Também precisa tomar cuidado, porque tem a obrigação de tomar partido", afirmou.

Na terça, o COI se pronunciou após a operação da Polícia Federal. A entidade, que é baseada em Lausanne, na Suíça, disse ter "total interesse" no esclarecimento desse assunto.

"O COI soube destas circunstâncias [da operação] por meio da imprensa e está fazendo todo o esforço possível para obter o máximo de informações. É do mais alto interesse do COI esclarecer este assunto", disse o comitê, por meio de nota.

COOPERAÇÃO

Ex-atleta olímpico, Maleson afirmou que ainda mantém a cooperação com as autoridades francesas e que "há mais apurações em andamento".

"Mas eu não tenho autorização para fazer comentários. O que é importante é que o passo crucial foi dado. Essa é a oportunidade única de limpar o COB", opinou.

Foi ele que passou às autoridades a informação de que Nuzman tinha um passaporte russo, o que foi confirmado na busca e apreensão feita por policiais nesta terça (5).

Como presidente de confederação, Maleson participou de assembleias do COB e esteve próximo da cúpula da entidade. Após os Jogos Pan-Americanos do Rio, em 2007, no entanto, a relação com Nuzman se esgarçou.

Ele se tornou opositor do cartola-mor do esporte olímpico brasileiro. As desavenças eram públicas. Maleson, por exemplo, foi o único a declarar voto contrário na eleição de Nuzman para a presidência do COB em 2012.

Também acusou o rival de ordenar uma invasão da sede da CBDG antes do referido pleito –o que o COB e Nuzman negaram.

Ira Wyman - 11.mar.1997/Folhapress
Eric Leme Maleson quando competia no bobsled, em 1997

A confederação de esportes no gelo, sob Maleson, chegou a sofrer intervenção do comitê olímpico nacional por problemas administrativos. O agora delator já foi acusado de problemas em prestações de contas e gestão temerária.

Hoje afastado do cenário esportivo nacional, Maleson mantém discurso de ataque. Critica o processo eleitoral e a falta de transparência nas contas do comitê nacional.

"Nuzman transformou o COB em uma agência de organização de megaeventos. O comitê perdeu o papel de entidade sem fins lucrativos e de massificação no esporte no país e se transformou em um realizador de megaeventos. A partir daí, o Nuzman passou a tratar o COB como balcão de negócios dele, disse.

"Uma coisa é certa. O COB, com a administração do Nuzman, não tem credibilidade nenhuma. Nem no Brasil nem lá fora."

Ele afirma que Nuzman deve pedir afastamento dos cargos que tem no COI, por exemplo: ele é membro honorário e integrante da comissão de coordenação dos Jogos de Tóquio-2020.


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