Folha de S. Paulo


Em Mundial de canoagem, Isaquias testa programação de olho em 2020

Isaquias Queiroz, 23, não conseguirá repetir neste ciclo olímpico a façanha que o tornou célebre nos Jogos do Rio. Porém, ele não reclama.

Primeiro brasileiro a obter três medalhas em uma mesma edição da Olimpíada, soube após o evento que uma das provas em que se sagrou medalhista –os 200 m, na qual levou bronze– foi retirada do programa de Tóquio-2020 pela federação internacional de sua modalidade.

No torneio e nos próximos três anos, o canoísta vai competir somente no C1 1.000 m e no C2 1.000 m (este em parceria com Erlon Souza). Nas duas provas ele conquistou a prata nos Jogos do Rio.

A partir desta quinta-feira (24), quando abre sua participação no Mundial de canoagem velocidade em Racice, na República Tcheca, Isaquias terá o primeiro grande teste dentro da nova realidade.

A eliminatória e a semifinal da disputa individual dos 1.000 m serão realizadas nesta quinta e a final, no sábado (26). Na prova em dupla, as séries ocorrem na sexta (25) e a decisão no domingo (27).

Apesar de ter uma chance a menos de ganhar medalha, o corte não é visto como prejudicial por Isaquias.

Ele acredita que concentrar o seu foco nas competições de 1.000 m tende a ajudá-lo no objetivo maior que é ser campeão olímpico em 2020. E também para ir ao alto do pódio na República Tcheca.

"Os 200 m são totalmente diferentes das provas que restaram, principalmente em termos de remada e estratégia. Com o foco nas provas de 1.000 m, facilita o ajuste e o ritmo. É melhor para mim", afirmou o medalhista olímpico à Folha, em junho.

A grande dificuldade era aliar as preparações em treinamentos para a prova curta e as duas mais longas.

Isaquias tinha de encontrar o meio termo entre a explosão e a resistência –o que, em resumo, não lhe permitiam se dedicar exclusivamente nem a uma nem a outra.

Na caminhada para os Jogos do Rio, ele e o técnico espanhol Jesus Morlán optaram por tentar três medalhas em busca de visibilidade para si e para a canoagem do país.

A escolha deu certo, mas representou um risco que o baiano não se furta a reconhecer. "Remar para tantas provas é difícil. Eu tinha medo de tentar abraçar o mundo e ficar sem nada", comentou em Lagoa Santa (MG).
prioridade

Nos três Mundiais realizados no último ciclo olímpico, em 2013, 2014 e 2015, Isaquias acumulou seis medalhas.

Ao todo, foram três ouros e três bronzes, mas nenhum na corrida individual de 1.000 m, que a partir de agora passou a ser sua prioridade.

Tal como no passado, seu principal rival na República Tcheca deve ser o alemão Sebastian Brendel, 29, que relegou o brasileiro aos vice-campeonatos nas duas provas de 1.000 m nos Jogos do Rio.

Seis anos mais novo do que o oponente, Isaquias acredita que reduzir a quantidade de provas será um trunfo nessa perseguição até 2020.

"Chegarei bem [aos Jogos de Tóquio]. Com ótima idade [26], focado no que devo fazer e com bom nível de treinamento. A única preocupação deve ser o Brendel. Mas eu não quero me preocupar tanto com isso, vou levar ano após ano", complementou.

Nesta temporada, o canoísta brasileiro competiu poucas vezes, mas bem. Ele faturou cinco medalhas de ouro no Sul-Americano que ocorreu em Paipa, na Colômbia.

Conquistou o ouro na prova de 1.000 m e a prata na de 200 m no Mundial sub-23, na Romênia. E obteve prata nos 1.000 m na etapa de Szeged (HUN) da Copa do Mundo.

TÉCNICO ACOMPANHA ATLETAS

No Mundial de Racice, Isaquias e Erlon desfrutam de uma companhia da qual não sabiam se poderiam contar há alguns meses.

Ambos serão orientados ao longo da competição pelo espanhol Jesus Morlán, que os treina desde 2013 e que os conduziu às medalhas na Rio-2016.

Após a bem-sucedida campanha olímpica, o ibérico foi pego de surpresa. Das mais negativas.

Em novembro, depois de um treinamento e reunião com integrantes do COB (Comitê Olímpico do Brasil), Jesus desmaiou na casa que serve de base para a seleção brasileira, em Lagoa Santa (MG).

Hospitalizado, passou por uma enormidade de exames e teve diagnosticado um tumor na base do cérebro. Além de cirurgia, teve de se submeter a quimioterapia e radioterapia, e a continuidade do trabalho com os brasileiros ficou em xeque.

A simples presença dele em Racice é uma vitória. Jesus ainda não está refeito do problema, porque o câncer que o acometeu é agressivo. Porém, ele não abre mão de manter o trabalho, enquanto tiver um mínimo de saúde, até os Jogos de 2020.

"Isaquias está diferente. Tinha receio de que ele perdesse o foco depois do Rio e perdesse o interesse, mas foi o contrário. Ele está muito maduro", afirmou à Folha em junho.

Isaquias atravessa uma fase nova. Será pai provavelmente em setembro de um menino (Sebastian) e se casará com a noiva, Laina, até o final do ano.

Jesus enxerga nessas mudanças o caminho para que o pupilo se mantenha determinado até a Olimpíada de Tóquio.

"Isaquias tem respondido muito bem aos treinamentos e chegará muito bem para disputar uma medalha no Japão", reforçou o treinador.

Depois dos próximos Jogos Olímpicos, a intenção do espanhol é deixar o dia a dia de treinamento dos brasileiros, mas ainda assim manter uma relação. "Ainda não conseguir arrumar a vida de Erlon e Isaquias", disse.


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