Folha de S. Paulo


Jogadores do Bom Senso esquecem briga com CBF e lutam por direitos

Ronny Santos - 13.mai.2017/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 13-05-2017 - CAMPEONATO BRASILEIRO CORINTHIANS X CHAPECOENSE - Lance na partida entre Corinthians x Chapecoense pela primeira rodada do campeonato brasileiro, no Itaquerao, Arena Corinthians. (Foto: Ronny Santos/Folhapress, VENCER) ***EXCLUSIVO AGORA *** EMBARGADA PARA VEICULOS ONLINE *** UOL E FOLHA.COM CONSULTAR FOTOGRAFIA DO AGORA *** FOLHAPRESS CONSULTAR FOTOGRAFIA AGORA *** FONES 3224 2169 * 3224 3342 ***
Jogadores de Corinthians e Chapecoense com faixas pretas de protesto na primeira rodada

Ainda que o Bom Senso tenha acabado, a mobilização dos jogadores de futebol continua. No vácuo deixado pelo grupo que entre 2013 e 2016 atuou pela transparência no futebol e pelos direitos dos atletas da modalidade surgiu o "Clube de Capitães", que atualmente age de maneira mais pragmática.

Encabeçado por atletas que também tinham força no Bom Senso, como Paulo André, Fernando Prass e Lúcio Flávio, o grupo é próximo da Fenapaf (Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol).

As discussões são feitas por meio de um grupo de WhatsApp que tem cerca de cem atletas considerados líderes de equipes de diferentes divisões nacionais. Todos os clubes das séries A e B do Brasileiro contam com pelo menos um representante. O meia Alex, ex-Palmeiras e Cruzeiro, e o meia Elano, assistente técnico do Santos, são alguns dos poucos ex-atletas no grupo.

Diferentemente do Bom Senso, que tinha posicionamento político agudo e fez forte contraponto à CBF, apontando continuamente as acusações de corrupção que a circundam, o Clube dos Capitães definiu metas mais específicas: fazer pressão contra medidas que, na visão deles, atingem negativamente os direitos dos jogadores, como, por exemplo, um projeto de lei que altera a cláusula compensatória no caso de rescisão de contrato de jogadores.

Hoje, quando o contrato é rompido, o clube deve pagar integralmente os salários previstos até o fim do acordo. Pelo projeto, dependendo do salário do jogador, o clube poderia pagar até 10% desse valor. A nova regra atingiria atletas que ganham acima de R$ 30 mil por mês, de forma escalonada -aqueles que ganham mais receberiam menor porcentagem na rescisão.

"Há diversas situações em curso que podem mexer muito no interesse dos atletas. Com o Bom Senso tentávamos, mas era difícil conseguir alguma coisa, faltava representatividade. A aproximação com a Fenapaf ajudou. Hoje também temos uma causa geral mais clara", diz Lúcio Flávio, que atualmente joga pelo Joinville na Série C.

Jorge Rodrigues-24.nov.2013/Eleven/Folhapress
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, 24 de Novembro de 2013 - CAMPEONATO BRASILEIRO - FLAMENGO X CORINTHIANS - Manifestacao do Bom Senso FC durante a partida valida pela 36a rodada do Campeonato Brasileiro, no Maracana. Foto: Jorge Rodrigues - Eleven. *** PARCEIRO FOLHAPRESS - FOTO COM CUSTO EXTRA E CRÉDITOS OBRIGATÓRIOS ***
Jogadores de Corinthians e Flamengo em um protesto do Bom Senso, em 2013

Bom Senso e Fenapaf não tinham relação. No entanto, o movimento e a federação se aproximaram meses após Felipe Augusto Leite, que é amigo de Lúcio Flávio, assumir a presidência da entidade, em fevereiro de 2016.

"Não fazemos política, mas defesa da categoria. Não nos interessamos pela política da CBF ou dos clubes, mas pela proteção do bem estar dos atletas. Queremos uma relação cordial entre todos", diz o presidente da Fenapaf.

Outras mudanças criticadas pelo grupo preveem fracionamento das folgas e das férias.

Além de combater essa proposta, os atletas pedem que os salários sejam integralmente registrados nas carteiras de trabalho -sem pagamento de direito de imagem, que pode corresponder a até 40% da remuneração mensal do atleta, de acordo com a Lei Pelé.

Na visão deles, não há vantagem em receber direitos de imagem -que sofrem tributação menor que o salário-, já que são frequentes os atrasos nesses pagamentos.

"Atualmente, o jogador não pode voltar a campo com menos de 24 horas de descanso. Querem fracionar em duas folgas de 12 horas, período que não dá nem para ficar com a família, ainda mais com as viagens que são inevitáveis no futebol e que clubes menores têm que percorrer de ônibus", diz Lúcio Flávio.

"Querem acabar com as férias coletivas. Pedimos um encontro com o presidente Michel Temer (PMDB), que nos encaminhou para o Ministério do Esporte. Não recebemos resposta. Estamos monitorando os projetos. Em relação ao que corre na Câmara, temos Andres Sanchez [ex-presidente do Corinthians] como presidente da comissão e [o deputado federal] Rogério Marinho (PSDB-RN), ex-dirigente do ABC, como relator. São duas figuras patronais."

Em maio, jogadores do Brasileiro entraram em campo com faixas pretas no braço para protestar contra as reformas. A atitude foi mais branda que as manifestações do Bom Senso, que chegaram a paralisar por cerca de 30 segundos todos os jogos da 34ª rodada do Brasileiro em 2013.

Segundo Leite, uma greve não está descartada.

"Se não vão mudar na conversa, vamos nos mobilizar."

Fazem parte do grupo Dudu, Prass, Zé Roberto (Palmeiras), Walter (Corinthians), Lugano, Rodrigo Caio (São Paulo), Ricardo Oliveira, Renato (Santos), Réver (Flamengo), Camilo, Jefferson (Botafogo), Nenê (Vasco), Henrique, Gum (Fluminense), entre outros.

O FIM

"Não tem mais Bom Senso FC."

A frase de Enrico Ambrogini, ex-diretor executivo do Bom Senso, encerra divergência que existia entre o corpo técnico e os jogadores em relação ao fim do grupo.

Em julho de 2016, a Folha revelou que o grupo da maneira que havia se tornado conhecido chegava ao fim de suas atividades. Os jogadores haviam decidido que não dariam mais a cara a tapa em nome do movimento, já que pautas importantes haviam sido conquistadas e vários deles vinham sofrendo represálias de clubes devido as ações políticas.

Pedro Ladeira - 21.jul.2014/Folhapress
BRASILIA, DF, BRASIL, 21-07-2014, 15h00: Presidente Dilma Rousseff, acompanhada do Ministro Aldo Rebelo (Esporte) e do Advogado Geral da União Luis Inácio Adams, recebe os atletas do Bom Senso Futebol Clube, movimento que busca mudanças na organização do futebol brasileiro. Os jogadores Rui e Dida estiveram presentes. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
Presidente Dilma Rousseff (PT) recebe os atletas do Bom Senso F.C. em julho de 2014

Na sequência, os diretores do Bom Senso soltaram nota em que diziam que o grupo não estava encerrado e continuaria suas atividades, e deram entrevistas reforçando a ideia de que seguiriam atuando. No entanto, desde então tanto os perfis em redes sociais como o site do grupo não foram atualizados.

"Não continuamos porque surgiram oportunidades profissionais", diz Ricardo Borges Martins, que também era diretor executivo do grupo e atualmente coordenador de mobilização da plataforma Minha Sampa.

"O Bom Senso surgiu como proposta interessante, mas infelizmente não foi muito à frente por causa da dificuldade do sistema do nosso país em relação ao futebol", diz Lúcio Flávio.

"O Bom Senso parou no sentido de fazer mobilizações. Um grupo menor ainda conversa sobre diversas coisas. O Clube dos Capitães abrange uma coisa maior, até por termos uma entidade representativa dos atletas por trás", completa.

Acolhido pelo governo Dilma Rousseff (PT) no período, o Bom Senso também perdeu parte de sua força com a intensificação da crise política no Brasil. Com isso, as pautas do grupo foram perdendo espaço na agenda política nacional.


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