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Opinião

Ainda bem que Fifa impediu mexicanos de gritarem 'puto'

Emmanuel Dunand - 29.jun.14/AFP
Mexican supporters cheer for their team during the Round of 16 football match between Netherlands and Mexico at Castelao Stadium in Fortaleza during the 2014 FIFA World Cup on June 29, 2014. AFP PHOTO / EMMANUEL DUNAND ORG XMIT: FK2240
Torcedores do México durante partida da Copa do Mundo no Brasil, em 2014

É preciso explicar em que contexto o mexicano usa a palavra "puto": alusivo a uma pessoa que tem medo de tudo, perdedor, conformista, sem raça, pipoqueiro. O termo em outras partes do mundo e também no México tem uma conotação pejorativa em relação ao homossexual.

No ano de 2000 nasceu o grito de "puto" no Estádio Jalisco de Guadalajara, um dos mais importantes do México.

Torcedores do Atlas estavam incomodados com Oswaldo Sánchez, goleiro das categorias de base do clube que foi contratado pelo rival Chivas Guadalajara. Foi aí que gritaram o xingamento sempre que ele cobrava tiros de meta. O grito vinha antecedido de um "ôooo".

Cabe assinalar que na cidade Guadalajara amigos se chamam de "putos". É uma expressão casual dentro de uma irmandade, como na Cidade do México as pessoas se referem a amigos como "güey".

A grito se popularizou durante o torneio Pré-Olímpico de 2004, em Guadalajara. A partir de então, se estendeu como grito de guerra em todos os estádios do México.

Quando chegou o Mundial da Alemanha de 2006, dois anos depois, já se havia convertido em um costume enraizado na torcida mexicana, que o levou para fora das fronteiras do país para intimidar dessa maneira o goleiro rival.

Em 2011 –casualmente, outra vez em Guadalajara– se estendeu a outros esportes nos Jogos Pan-Americanos, como o vôlei.

Não demoraram a chegar as chamadas de atenção em relação à maneira do torcedor mexicano em apoiar a seleção. Relembremos que em 2014 a Fifa começou a tomar consciência das atitudes discriminatórias lançando a campanha "Não ao Racismo". Tanto que na Copa do Mundo se abriu um procedimento após o duelo entre Brasil e México porque as duas torcidas utilizaram a expressão uma ou outra vez.

Apesar de o torcedor mexicano não gostar e se lamentar, não há melhor maneira de se solucionar este tema do que a adotada pela Fifa.

Talvez soará exagerado, mas depois de uma, duas, até três chamadas de atenção, o grito não desapareceu. Ao contrário. Retumbava com maior claridade. Se há algo que caracteriza o mexicano é demonstrar que pode mais do que os outros. Pensava o torcedor mexicano que podia mais que a Fifa e se equivocou.

A Fifa levantou sua voz: um grito mais na arquibancada e o México pode perder pontos por causa de sua torcida.

Esportivamente falando, é uma grosseria para o futebolista. De maneira pragmática, foi o único jeito de se frear este grito em partidas internacionais.

O jogo entre México e Nova Zelândia foi o exemplo. A torcida reagiu bem e trocou os insultos por aplausos. Lástima que teve de ser por causa de uma ameaça.

Jornalista do "La Afición", do México

Clique na imagem abaixo para conferir o especial da Folha sobre o que gritam as torcidas brasileiras nas arquibancadas.

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